Coletivo Indra

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A mediocridade, o Não e mais um ano novo

Caio Sóh

Aqui estou, escrevendo mais um último texto do ano. O mesmo Felipe que hoje é outro. No mesmo Blog.G que hoje também é outro. O tempo é uma conjugação verbal infinita. Não pára, não cessa e em um ano tudo é novo de novo. De lá pra cá o aconchego deu lugar a ressignificação, a enumeração abriu alas para a intensidade. Sentir é melhor que idealizar. 

O relato anterior foi embalado por uma lista de projeções e expectativas. A grande maioria das coisas se aprisionaram no papel e outras se desfizeram pelo caminho. Indomável é o fluxo da vida. Por vezes, a gente mergulha fundo na certeza que o peito está cheio de ar, e mais adiante, percebemos que as braçadas vão contracorrente. Entramos num estado de apnéia do querer que se intensifica na taquicardia de desejar o reflexo do que desejam de nós. 

Na ordem natural da vida a gente nasce, cresce, reproduz, envelhece e morre. Mas na delicada fissura entre um rito e outro, há uma vivência clandestina, não catalogada. Um período que podemos chamar de agradabilidade obrigatória. É aquela fase que a gente faz tudo (ou deixa de fazer muita coisa) simplesmente pelo propósito de agradar ao redor. O agradar vem acompanhado do ser aceito, do ser bem quisto e da estabilidade emocional que tudo isso proporciona.    

Dizer sim pro outro e negar a si mesmo não vale o preço. O não é um ato de descolonização do pensamento, do estado de ser diante o mundo. Cada pessoa tem um tempo próprio pra se reencontrar com a desagradabilidade congênita que nos torna únicos, do nosso jeito. A partir das vivências entendemos que nada pode prevalecer à nossa vontade, ao nosso bem-estar interior. Tenho aprendido que exceto na infância - onde o poder de escolha é induzido - não somos obrigados a nada. A gente se obriga.

E ESSA CULTURA DA OBRIGAÇÃO FAZ PARTE DA LISTA DE SOBREVIVÊNCIA, DE SUCESSO, DE MEDIOCRIDADES. 

2019 foi um ano difícil. Uma tormenta desgovernada de acontecimentos e emoções. Mesmo quando conseguíamos ficar bem, algo inquietava o peito. Foi um exercício de reflexão e entendimento do mundo e, principalmente, de nós mesmos. Sentimos o lugar do outro com intensidade e aprendemos muito com isso. Ainda que os dissabores se façam constantes num solo árido de incertezas temos que continuar colhendo céus.          

Cada ano que termina é um caleidoscópio de fins e inícios que racionalmente ousamos dizer que temos consciência do local onde a raíz se finca e do momento em que ela começa a morrer. A maturidade me ensina dia após dia que eu não preciso ser perfeito, que nem sempre chegar é a melhor parte da viagem, que dar check não é mais gratificante do que sentir o inesperado acontecer. Se hoje conseguirmos ser menos medíocres do que fomos ontem, estamos no caminho certo e já valeu a travessia.


Felipe Ferreira

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