Coletivo Indra

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A Partida

imagem Pinterest

“Alguém já disse que haverá um fim

Um fim, oh, um fim, para amar e lamentar a perda” 

 May Sarton.


Há mais ou menos uma semana estava em sala de aula e fui surpreendida com a notícia da morte de Murilo, um bebe prematuro, gemelar, que ia fazer 4 meses esta semana. Entrei neste luto, e lembrei que perdi um sobrinho gêmeo com 2 anos também. Apesar de sabermos que a morte existe, não achamos que nosso filhos ou sobrinhos irão partir antes de nós.

Li o texto corajoso no Instagram de sua mãe Raquel, na dor de seu luto, agradecendo a sua curta existência. Mais cedo ou mais tarde aprendemos que a perda é uma condição humana. Mas quando longe de nós é só uma falácia. Sentimos a dor, a tristeza, mas não estamos no contexto. 

Conheço muitas mães que perderam seus filhos e não conseguiram transcender esta perda. Entraram no luto eterno e esqueceram de seus outros filhos. Morreram para eles e para elas também. É um golpe doloroso, sem explicação. A capacidade de entender este significado some de nossa cabeça. Nosso coração fica apertado e dói. Resta a dor de um imensa perda, que durará meses e anos até anos.

O relato dos que passaram por isto é descrito como um dos acontecimentos mais dilacerantes da vida de alguém. Considera-se uma morte antinatural. Os filhos é que enterram seus pais. Os filhos são vistos como continuidade natural de seus pais, e o futuro deles, que se perpetua na prole.

O sofrimento dos pais será sempre independente da idade que seus filhos partam. Para um pai ou uma mãe, a morte do filho tem a mesma intensidade seja um recém-nascido, um bebe, uma criança, um adolescente, um adulto, ou mesmo um idoso. Os relatos de pais que perderam filhos em diferentes idades assemelham-se. Isto acontece em relação a filhos únicos ou a filhos que pertenciam a uma família mais ou menos extensa. 

Há toda uma expectativa no nascimento de um filho que envolve toda a família. Desde o mais remoto planejamento da gravidez ao nascimento, muitas eventualidades, dúvidas e medos perpassam nossa alma. Fazemos muitos exames para saber se este filho será saudável em princípio ou já nascerá com alguma morbidade. É uma forma de nos prepararmos para as adversidades. Algumas patologias podem comprometer a vida de seu filho e você então procura ajuda desde o nascimento. 

Mesmo o aborto já é uma perda e as mães e pais sofrem este luto. O útero é nossa casa. Mas mães que sofrem um aborto sentem desamparo, culpa e impotência.  O pai é geralmente mais inibido nas expressões da sua dor e recebe, em muitos casos, a dura missão de apoiar a mãe – como se ele não sofresse tanto como ela, como se um homem, simplesmente por ser homem, tivesse nascido forte, imperturbável e impávido. 

Um pai pode sofrer tanto como uma mãe, não sendo, sequer, possível medir a sua dor para se comparar com a dor desta. Nem sendo também, correto exigir de um pai que perdeu o seu filho, que deixe de parte o seu processo de luto para atender, em exclusividade, ao processo de luto da mãe. O relato de pais sobre o aborto é de compassividade, mas de que esse sofrimento é pior para elas, que estavam no processo de transformação hormonal. 

No entanto, a sociedade em geral, julga o pai e não perdoa sua fraqueza de não ser capaz de apoiar a mãe, renunciando, assim, a corresponder às expectativas que, à sua volta se formaram. Os pais geralmente, voltam mais rapidamente à sua vida quotidiana, ao emprego, do que as mães, a quem parece ser mais desculpável a incapacidade e o bloqueio, permanecendo em casa mais tempo. Afinal o útero é a nossa casa e as transformações da gestação são fortes para a mulher. 

Passar pelo estágio da dor, diz Pastan, é como subir uma escada em espiral e como aprender a subir por ela depois de uma amputação. Maravilhosa afirmação. Poderemos nos reorganizar, nos confortarmos na religiões, mas a memória estará sempre lá a lembrar.

Em “Lamento e Melancolia", Freud pergunta: em que consiste a lamentação pelo que perdemos?

"Se trata de um processo interior difícil e lento, extremamente doloroso, em que desistimos passo a passo. “

Mas sabemos que há um tempo para este luto e um tempo para parar de lamentar, e estas etapas dependem de seu envolvimento com este ser. Passamos por vários processos nesta caminhada e sempre precisamos de ajuda externa e força interior para assimilar a ideia da separação.

Leva muito tempo depois do processo da dor inicial para que a morte seja aceita como realidade. Entramos em sofrimento psíquico, choramos e lamentamos, gritamos, entristecemos, nos isolamos. Fases de letargia e ansiedade, ansiedade da separação e até raiva pelo acontecido, com blasfêmia. Paramos de acreditar em todos os deuses protetores. Depois entramos no luto verdadeiro e passamos pelo processo de aceitação, recuperação e adaptação.

A saudade vai ficando como um sentimento de pertencimento deste ser, pois carregamos ele dentro de nós como ele estivesse compartilhando nossa caminhada e então a energia de vida volta. É preciso falar sobre esse sofrimento, para não ficar sufocado, aliviando a dor e saber enfim que o tempo será o melhor remédio.

Os relato é de que o luto dure de 1 a 2 anos.

Na vida cada final é um novo começo. E nessa longa estrada de nossa existência os desafios vão nos ensinando a crescer. Os filhos são insubstituíveis, e aquela criança nunca deixará de ocupar o seu espaço afetivo na memória dos seus pais e familiares. Fará sempre parte da constelação familiar.

Que possamos olhar sempre para um novo dia e todas as suas promessas de renovação e alegrias.

Com carinho

Hayde Haviaras

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