Coletivo Indra

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Amazônia

Foto | “Olhos da Natureza” - Ricardo Stuckert

Quando fui à Amazônia, em 2003, me lembro de chorar, olhando pela janela do avião. Muito verde! Eu sabia que era a maior floresta tropical do mundo mas, mesmo assim, me impressionei. Essa foi a primeira boa sensação. Descendo em Manaus, que já foi conhecida como a “Paris tropical” no século XX, devido a seu rápido desenvolvimento durante os tempos áureos da borracha, vi que a cidade mais populosa e capital do estado, retornara a seu posto subdesenvolvido. Nem o belo Teatro Amazonas, Patrimônio Histórico Nacional, construído com a pompa da época, sustentaria tal título.

Fomos para o porto. Nosso destino era um hotel que ficava a duas horas de viagem pelo Rio Negro. No meio do caminho, demos um mergulho naquela água cheia de originalidade, cor de mate. Foi a segunda “good vibe” da saga. E também, o primeiro aviso de que a Natureza é forte e imprevisível. Senti uma correnteza me levando para longe. Tiveram que ir ao meu encontro, jogaram a boia de salvamento e pronto. Entendi o recado do Boto Rosa.

Arquivo Pessoal

Chegamos! E eu parecia a Pandora querendo saber o que tinha dentro da caixa. Quarto em cima da árvore, macacos-hóspedes, araras, muitos pássaros...ué...e os mosquitos? Eu tinha ido preparada para lutar contra um exército de culicidaes. Foi então que descobri que o Ph das águas do Rio Negro era ácido e espantava-os. Subi para o meu quarto prestando a atenção em cada ser vivo daquele lugar, aspirando o ar mais puro que eu já tinha experimentado.

A noite acorda, o céu acende suas estrelas e nós, num barquinho comandado por um filho da terra, navegamos rumo a um ritual indígena. Parecia cena de filme. O fog se espalhava pelo breu, dando um ar de suspense. Mas nada mais misterioso do que os diversos sons que ouvíamos. Eu queria seguir pelo menos um para descobrir o que era. Continuamos. Enquanto eu olhava para frente e agradecia por poder estar vivendo aquilo, em estado quase letárgico, percebi que estávamos indo para perto da margem. Achei que estávamos chegando quando ouvi o nativo perguntar: “sabem o que são esses pontos vermelhos na água? Os olhos dos jacarés.” E mal acabou de falar, já deu um pulo na água e emergiu com um filhote nas mãos. Todos tiramos fotos, confesso que achei o máximo!

Finalmente, chegamos! Caminhamos mata adentro até chegar na Oca. A tribo nos aguardava. O que vi ali foi um espetáculo que orgulharia o deus Dionísio. Só que ao invés do vinho, uma bebida alcoólica feita pelas mulheres e fermentada com suas salivas. Aceitei primeiro, por educação e então, perguntei como a faziam. “O Cauim é à base de mandioca. Elas são cozidas, mastigadas e recozidos (para que as enzimas presentes na saliva possam quebrar o amido em açúcares fermentáveis). Esse tipo de processo foi originalmente criado no Japão para fazer o saquê.

Comemos, dançamos, experimentamos o cachimbo da paz, compramos uns artesanatos e partimos. Eu estava muito tocada com tanta Natureza, por estar entre os índios, com a simplicidade da vida dos ribeirinhos...tudo era tão intenso e tão natural. No dia seguinte, fomos conhecer um vilarejo. À beira do rio, algumas casas de madeira se enfileiravam, formando a única rua, que era iniciada por uma escola. Foi o que mais me chamou a atenção. Quis conhecer.

Uma moça ensinava umas dez crianças, mais ou menos. Sem estrutura, sem investimento e sem uma formação acadêmica, ela lecionava. Agora, me vem à cabeça, o livro do francês Jacques Rancière, o Mestre Ignorante, onde um educador cria um método de ensino autoeducativo. O papel dele é apenas questionar e assim, o aprendiz vai se interessando em aprender aquilo. No método, o “ignorante” também vai aprendendo com as respostas de seus alunos. Naquela pequena sala da vila tupiniquim ou na sala do professor Joseph Jacotot, o que importava mesmo era a busca pelo conhecimento.

Arquivo pessoal

Voltemos à Amazônia. Voltei da Amazônia. Fiquei alguns dias, pensando nas sensações que trouxera no bagageiro do meu coração. E agora, escrevendo esse texto e refletindo sobre tudo o que esse Olimpo Natural vem sofrendo, me pergunto: “Será que quando eu voltar, eu respirarei o mesmo ar puro? Será que eu conseguirei retornar àquela tribo para pedir uma segunda dose do seu elixir? Será que eu poderei pedir desculpas ao jacaré por ter tirado uma foto da sua captura e ter achado o máximo isso? Será? Eu tenho esperança que sim! Que a Pandora amazônica consiga fechar sua caixa a tempo de essa esperança não virar cinzas. 

Fernanda Freitas

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