“brasil ENTRE portugal” na filosofia de Braulio Giordano.
Ele mora na filosofia e em terras portuguesas. O entrevistado que inaugura essa sessão especial de diálogo luso-brasileiro é o ator e filósofo Braulio Giordano, de 34 anos.
Nessa série de entrevistas com pessoas que saíram do Brasil, pelos mais diversos motivos, para residir na terrinha, vamos entender um pouco mais dessa relação histórica que aproxima brasileiros e portugueses.
Há 3 anos morando em Portugal ele conta como foi a decisão de sair do país de origem, os pormenores da mudança, e botar na balança os dois lados que compõem a diferença de línguas, de hábitos, de águas, de terra.
Como canta Caê na letra de “Mora na Filosofia”, pra quê rimar amor e dor (se podemos alternar e equilibrar a embarcação de coragem e saudade numa mesma partida)?
BRAULIO GIORDANO
I - A decisão de morar fora do Brasil aconteceu por algum motivo específico (trabalho, estudo, família…)? Como se desenhou esse processo de migração e a escolha por Portugal?
Ela primeiramente aconteceu por eu ter cidadania italiana. Isso me ajudou a ter essa escolha e essa vontade de morar fora do Brasil. Portugal foi o país que eu escolhi não só pela língua, pela proximidade de cultura entre os dois países, mas também porque tem um estudo muito interessante de filosofia contemporânea, principalmente na Universidade do Porto, e então o estudo foi um motivo mais forte que me fez decidir por Portugal pra seguir os estudos filosóficos.
II - Você tem alguma relação afetiva, emocional, familiar com Portugal?
Não tenho. Teria com a Itália. Mas em Portugal não.
III - Como é ser um ator brasileiro residindo em território português? Como o artista brasileiro é visto pelos portugueses e como o mercado artístico lusitano lida com esse fluxo cada vez maior de profissionais brasileiros?
Não é tão simples porque tem muito mais papéis para atores portugueses do que brasileiros. Mas sempre tem um personagem brasileiro numa novela portuguesa. Então é possível, só que é um funil. Então não é tão simples você se manter aqui como ator. Aliás, não é tão simples você se manter como ator em qualquer lugar. Ser artista é muito difícil e não muda aqui mesmo tendo a mesma língua. Acredito que no Brasil ainda é um caminho mais fácil do que aqui. No Brasil tem muito mais produções do que em Portugal. O artista é visto aqui acredito que positivamente. Todo mundo gosta dos atores brasileiros, dos músicos brasileiros, de outros tipos de artistas. O fluxo tem aumentado bastante desde 2018, o ano que eu cheguei. Muitos brasileiros têm adquirido empregos portugueses e talvez, isso cause um tipo de distância do português com o brasileiro, por mais que sejam muito próximos. Eles se mantêm um pouco afastados… ressabiados, talvez. Porque os brasileiros chegam aqui com tudo.
IV - Como é sua relação com a língua aí em Portugal? Há muita diferença entre o português brasileiro e o português lusitano na escrita e na oralidade? Já passou por alguma situação constrangedora e/ou engraçada causada por peculiaridades linguísticas entre os dois idiomas?
Eu nunca tentei modificar minha forma de falar aqui em Portugal. Nunca tive a intenção de modificar. Sempre me assumi brasileiro, porque as línguas são diferentes sim, por mais que sejam parecidas e ambas português, o modo de falar é completamente diferente. Se fala português, mas não se fala ao mesmo tempo (risos). Acho que é um pouco isso. E na escrita, a mesma coisa. Eu fiz mestrado aqui, sei porque a escrita modifica bastante. Não são todas as palavras que mudam, são algumas expressões, algumas palavras que aqui ainda se escrevem dessa forma, como “facto”, por exemplo, e no Brasil já não se escreve mais assim. Algumas coisas permaneceram e já no Brasil não tem mais. Se for usar a língua portuguesa dos portugueses aqui é preciso ter essa modificação. Com relação à situação constrangedora, acredito que não. Comigo nunca aconteceu. Tem a brincadeira do gerúndio. Aqui eles não falam gerúndio. Andando, caminhando, estava gostando… aqui é estava a gostar. Tem essa coisinha que a gente fala bastante e eles não falam, não pronunciam. Pra eles é até errado.
V - Quais são as diferenças e as semelhanças da vida aqui e aí em Portugal no que compreende qualidade de vida, oportunidade de trabalho, estrutura social, conjuntura político-cultural?
A vida aqui em Portugal é muito legal, muito bacana. A qualidade de vida é muito boa. Aqui o dinheiro vale. Então com pouco dinheiro você faz uma compra no mercado, assim razoável, por exemplo. É seguro. Nós não temos medo. Não há medo. Não há violência. Só que de negativo, não tem emprego. É muito difícil ter um emprego que se ganhe bem e que seja um diferencial, ou que seja na sua área. Porque a grande parte ou a grande maioria deles estão nos, que eles chamam, de setores de restauração, que são restaurantes, hotelaria, entrega de comida, táxi… Já não se ganha muito. Tem alguns poréns, como esses. Sem falar com relação ao aluguel. Os aluguéis são muito caros, bem acima da média. Aqui o salário mínimo é 600 e pouquinhos euros e grande parte dos apartamentos, dos aluguéis é mais que isso… Então é por isso que aqui se ganha muito dinheiro com alojamento local, que é tipo um airbnb, mas não é. As pessoas têm propriedades e alugam pra estrangeiros e isso dá muito dinheiro. A galera ganha muito dinheiro com isso aqui. A estrutura social é muito parecida, como as pessoas ganham mais ou menos a mesma coisa, claro que tem seu diferencial, tem uma minoria que ganha mais. Mas a grande maioria ganha a mesma coisa e isso é até bacana de ver porque as pessoas frequentam os mesmos mercados. Tem só um tipo de mercado aqui. Não tem mercado do rico, mercado do pobre, como tem no Brasil.
“ BATE & VOLTA “
Um lugar: Gerês
Um café: Miolo (Bairro Alto, Lisboa)
Uma vista: Wow Porto, The World of Wine (Vila Nova de Gaia)
Uma canção para viajar: “All my days” de Alexi Murdoch
Entre Brasil e Portugal... há um elo indescritível
Felipe Ferreira
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