Coletivo Indra

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Dias dos Namorados

Louvar e clamar

Como surgiu o “Dia dos Namorados”?

No mundo inteiro, esta data é comemorada no dia 14 de fevereiro. Por que, somente no Brasil, comemoramos no dia 12 de junho?

 Nos outros continentes, a comemoração está relacionada ao sacerdote católico que viveu no século III, algumas vezes, designado como Padre Valentim, outras como o Bispo Valentim. Um santo muito popular na França e na Inglaterra desde a Idade Média.

De acordo com os relatos[1], durante o século III, as tribos germânicas como Alamamos, Godos, além do Império de Palmira, atuais Síria e Palestina, no oriente médio, ameaçavam o poder de Roma.

De 268 a 270, o Imperador romano Cláudio II (214-270) decretou a proibição dos casamentos. A motivação era simples: se os homens não fossem casados, eles estariam mais disponíveis para proteger o Império romano nos campos de batalha.

Padre Valentim continuou celebrando casamentos secretamente, além de ser conhecido como conselheiro matrimonial que cuidava do bem-estar de casais que passavam por brigas e desavenças. Os relatos da Idade Média reforçam que as suas palavras tinham poder de apaziguar conflitos e devolver o brilho da paixão na vida do casal.

Padre Valentim foi preso quando descoberto, na prisão, ele ficou sob responsabilidade de Astério, o prefeito de Roma, que sofria uma grande angústia por ter uma filha cega e declarou que se converteria ao cristianismo se o padre Valentim curasse sua filha.

Após as orações do padre, a filha do prefeito de Roma passou a enxergar. Além disso, o ânimo de Valentim alegrava os outros prisioneiros que ouviam suas orações.

Diante disso, o prefeito se converteu ao cristianismo e libertou todos os prisioneiros cristãos, o que desagradou o imperador que ordenou a decapitação de Valentim no dia 14 de fevereiro de 269[2].

Em 494, diante da celebração de uma festa popular romana que acontecia 15 de fevereiro, o Papa Gelásio decretou a proibição do rito pagão e o substitui pelo martírio do padre que séculos antes tinha enfrentado o poder de Roma para celebrar casamentos, transformando-o em santo e patrono dos namorados e noivos. Estava criado o Dia de São Valentim.

No ano de 1969, a Igreja Católica retirou São Valentim do Calendário dos Santos, mas o dia se mantém como data comemorativa do sentimento dos namorados.

No Norte, faz sentido recomendar uma data que é pautada pela combinação entre interesses capitalistas e um ex-santo católico como símbolo de amor?

Nesse contexto, faz sentido recomendar uma data que é pautada pela combinação entre interesses capitalistas e um ex-santo católico como símbolo de amor?

No Brasil, o santo católico que era inspiração original foi jogado para escanteio para atender demandas comerciais. Faz sentido inscrever o Dia dos Namorados nesse registro? Aqui, diante de um mês com pouca movimentação no comércio, foi João Agripino Doria (1919-2000), dono da Agência Standart Propaganda, que em 1948 estabeleceu 12 de junho como Dia dos Namorados.

O anunciador

De início, a data seria o dia 13 de junho, em alusão à data de comemoração do dia do patrono do casamento, Santo Antônio – Fernando Antônio Bulhões (1195-1231). A respeito de Santo Antônio, conforme conta a história, o sacerdote português resolveu a desavença de um casal.

Um homem desconfiava da esposa depois do nascimento do filho; a esposa se defendia, mas o marido não acreditava e buscou tirar satisfações com o homem que ele dizia ser amante dela. Na ocasião, o santo católico pegou a criança recém-nascida no colo e perguntou quem era seu pai, o bebê recém-nascido falou o nome do marido, a desconfiança desapareceu e o casal permaneceu junto.

A Agência Standart Propaganda projetou usar esta data para formalizar o Dia dos Namorados no Brasil; mas, em 1948, 13 de junho foi domingo.

Daí, por questões de arranjo, a data estabelecida foi o 12 de junho por ser num sábado e comportar compras de última hora.

No Brasil, a base não deixa de ser religiosa, mas funciona muito mais como pretexto para ancorar um projeto publicitário para mobilizar o comércio num mês sem datas expressivas para aumento de vendas, pois o santo católico que era inspiração original foi jogado para escanteio para atender demandas comerciais.

Faz sentido inscrever o Dia dos Namorados nesses registros? Ora, os sentidos são dinâmicos e uma das atividades preferidas dos seres humanos é reocupar os signos.

Ressignificar o Dia dos Namorados é uma possibilidade bastante interessante. Fica apenas uma questão: o que é mais poderoso, o amor que reinventa sentidos ou o mercado que precifica os produtos e serviços?

Para além dessas histórias de origem da data, nós podemos ressaltar mais um aspecto.

O Dia dos Namorados é uma data para inflexão de como os discursos amorosos podem estar baseados em discurso religioso cristão católico e propaganda para mobilizar o nosso desejo fetichista pela mercadoria nas sociedades capitalistas.

 Renato Noguera

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[1] Disponível em: https://formacao.cancaonova.com/igreja/santos/sao-valentim-grande-conselheiro-e-patrono-dos-namorados/ e https://rumodafe.com.br/sao-valentim/#:~:text=Valentim%2C%20depois%20da%20condena%C3%A7%C3%A3o%20de,m%C3%A1rtir%20casamenteiro%2C%20canonizando%2Do.

[2] A respeito da data existem indicações que poderia ter sido em 270, 272 ou 273.