Coletivo Indra

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Enfim uma cama de casal

Arqueivo pessoal

Era noite de Natal.

Por mais que estivéssemos passando momentos deliciosos com nossa família, não parava de pensar no que aconteceria no final daquela noite, e em tudo que havíamos passado até chegar lá. Quase 6 anos juntas.

A Jaque estava lá...sempre esteve...a minha “melhor amiga”.

As barras que seguramos juntas não foram poucas. Primeiro a aceitação dos pais. O apoio dos irmãos. O ombro dos amigos. E o acolhimento, bem aos poucos, de toda a família. Fizemos uma escolha: sem pé na porta. A escolha foi realmente nossa, mas rendeu quase 6 anos vivendo com privação de carinhos e separadas por uma cama e um colchão – o que seria suficiente para “melhores amigas”.

Me lembro que, ainda na faculdade, minhas amigas diziam: “a primeira a casar vai ser a Fefe”. Me entristecia pensar no desgosto que isso poderia trazer às nossas famílias, aos nossos avós... Acontece que, depois de quase 6 anos, não fazia mais sentido. O “nós” precisava vir à tona e ocupar o seu lugar. Eu a amo e quero ama-la para sempre...não foi só uma fase...preciso que o mundo saiba disso!

Depois daquela noite de Natal eu sabia que as coisas teriam que mudar. E talvez a mudança tivesse que partir de nós mesmas. Ao chegarmos na casa de meus pais, na madrugada do dia 25, eu fiz o pedido de casamento...na sala... na presença de meus pais e minha irmã. Pode ter sido uma grande pressão para ela, mas eu só pensava no quão importante esse momento seria para mim e na alegria de poder compartilhar isso com eles.

Apesar de meio nervosa, ela disse sim! Ufa... agora sim... minha noiva! Fomos dormir. Me deitei em minha cama e ela no colchão ao lado. Estava muito feliz e com muita expectativa do que estaria por vir.

Passada a euforia, chega a hora de lidarmos com a realidade... “Fernanda, tudo bem, pode casar, mas sem contar para o seu avô” ou “Fernanda, seu avô precisa saber, de uma vez por todas, sobre vocês”...

Aí eu me lembrei exatamente o que eu respondia para as minhas amigas naquelas brincadeiras: “Não sejam ridículas, eu não quero matar o meu avô de desgosto”.

Pensando bem... 6 anos depois... a Jaque já faz parte dessa família. Todos a amam como se fosse uma filha/sobrinha/neta... não pode “dar ruim” nesse nível. Pedi a ajuda dos meus pais, dos meus tios, para que pudéssemos enfim abrir o jogo com meu avô e sua irmã, minha tia-avó (a Dedi). Todos apoiando...mas todos na maior tensão.

Aconteceu no dia seguinte. Chegamos lá...jantamos...era hora do café, aquele momento que meu avô vai para a cozinha preparar o nosso café... é o momento dele! Todos na sala olhavam para nós e esperavam que começássemos com a Dedi. E assim que aconteceu...

“Dedi, eu e a Jaque precisamos te contar uma coisa....” ...nossa, como foi difícil prosseguir. As palavras não saiam. O medo da rejeição era imenso.

Ela percebendo nossa aflição se adiantou: “Você e a Jaque? ... para... não precisa falar mais nada... eu já sei!”

Todos em coro: “Já sabe? Sabe do que?”

“Você e a Jaque, oras... Claro que eu sei! E tá tudo certo. Por que o espanto? Não é normal? Pra mim é normal, pra vocês eu pensei que fosse também”.

Rimos, sorrimos, choramos, nos abraçamos... ficou tudo bem! Mas ainda faltava uma pessoa...a mais importante de todas. O cara do café.

“Mas Dedi, agora precisamos da sua ajuda com o Vovô”.

“O que? Seu Vô? Contar pra ele? .... Ele que me cantou essa bola!!!”

Mais risos e um alívio do tamanho do mundo!

Mesmo assim, a história tinha que ser oficialmente contada a ele. Devíamos fazer isso de qualquer forma. Então, após uma ajuda da minha tia.... de repente, ele aparece na sala (sem o esperado café).

Mais uma vez a tensão volta a reinar na sala.

Arquivo pessoal

Antes que falássemos qualquer coisa, ele vem em nossa direção, abre os braços, nos acolhe em um caloroso abraço e nos diz que o seu sonho era nos ver felizes e juntas assumindo e prosperando no escritório que ele havia fundado quando começou a advogar – a Jaque, ainda estudante de Direito, agora oficialmente entrava para o legado da família, talvez aquilo que mais orgulha aquele velho doutorzinho.

Incrível como depois disso tudo ficou mais fácil, seja dentro, seja fora de casa... Se aquele senhor abriu os braços para nós, o que devemos temer?

Nos casamos, adotamos um filho peludo, e quando voltamos à casa dos meus pais para passar uma curta temporada, nos esperava uma cama de casal.

Fernanda Darcie

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