Coletivo Indra

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Leões, raposas e asnos

Senadores Raldolfe Rodrigues (REDE-AP), autor do requerimento que propôs a CPI, o relator Renan Calheiros (MDB-AL) e o presidente Omar Aziz (PSD-AM)

Foto: Edilson Rodrigues, Agência Senado.

As velhas raposas da política costumam ter consciência do quão perigoso é menosprezar a incompetência do seu adversário político, sob pena de ser trapaceado ou enganado.

Ao mesmo tempo, essas criaturas engenhosas e articuladoras da vida política sabem o quão importante é se aproximar dos leões, majestosos e fortes, aliados com os quais todos querem se unir, ainda que para o sucesso do leão seja necessário a astúcia da raposa.

No Brasil também temos esses tipos, mas o que caracteriza a situação atual é que o presidente da república, embora ocupe o posto de leão por excelência, é visto como asno.

A cobertura da sessão final da CPI da Covid-19 é iniciada, como de costume, com entrevistas aos senadores que estão chegando no auditório onde será realizada a leitura do relatório final.

De imediato, somos surpreendidos com cenas grotescas, como comportamento agressivo do senador Flávio Bolsonaro.

Não ouviu as perguntas da imprenssa, sua única missão ali era afirmar a política do governo e negar todas as acusações, de crime contra a humanidade e  corrupção. A tentativa de velar a realidade com uma suposta inocência do presidente é de praxe. E não seria diferente agora, em que ele é indiciado por uma miríade de crimes.

A resposta do presidente? Uma gargalhada zombeteira, que nos faz pensar se não estamos em um quadrinho de Alan Moore, a Piada Mortal.

Ou seja, ele nega a acusação de que é responsável intencionalmente pelas mortes de 600 mil pessoas. Numa conta que já vai fechar na população de duas Islândias. Ora, enquanto o mundo todo fechava suas portas e ouvia os cientistas, Jair Bolsonaro incentivava aglomerações, desencorajava a vacinação e o uso de máscaras – atitude que o fez ser acusado de charlatanismo.

Contudo, apesar de ser bem fundamentada a acusação de crime de genocídio contra as etnias indígenas brasileiras, os senadores da república retiraram-na, certamente por pensar que foram longe demais com as incriminações.

Mas por que retirar essa acusação tão política e fundamental para a seriedade da vida democrática brasileira?

Talvez por considerá-lo um asno, que como tal não expressa a capacidade de discernimento.

“Melhor mesmo esperar que seu mandato termine e nos livremos dele” – alguns podem ter pensando. E nesse momento, quase ouvimos as risadas das raposas na parreira.

De qualquer modo, Jair Bolsonaro é um candidato forte à reeleição em 2022. Apesar da queda da popularidade e das provocações que os cidadãos sofreram nessa pandemia, ainda assim, é melhor considerá-lo uma raposa na política.

E das mais astutas, já que de asno não tem nada, pois com sua dissimulação pode convencer seu eleitorado de que ainda é a melhor alternativa ao Brasil, de que ele é o mais bem intencionado dos políticos brasileiros.

Seja um lobo em pele de cordeiro, ou uma raposa em pele de asno, ou um asno em pele de asno, é importante termos em vista que também na política as aparências enganam. E para sabermos a verdade efetiva das coisas é importante estarmos atentos às ações do oponente e considerar que tudo foi calculado e orquestrado.

E se aguçarmos os nossos ouvidos podemos ouvir as risadas das raposas.

 Marina Rute Pacheco

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