Coletivo Indra

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O sorriso de Samuel

“Por que tenho que morrer por uma guerra que não é minha?”

Estas foram as últimas palavras de Samuel Peixoto da Silva. Samuka, como era conhecido, tinha acabado de ter seu primeiro filho: Benjamim, que perde o pai com apenas 3 meses de vida. Samuel estava tão feliz com sua nova família que seu sorriso que já era farto, tornou-se ainda mais solar.

Aos 14 anos foi matriculado em uma escola de judô. Apaixonou-se pelo esporte e decidiu se profissionalizar em artes marciais. Samuel dava aula particulares e para crianças na comunidade onde morava. Trabalhava em projetos sociais por que acreditava que as coisas poderiam melhorar. Colocava toda sua energia e afeto na relação com seus alunos. Que o adoravam!

Samuel voltava do trabalho quando foi atingido nas costas. Estava trabalhando também como moto taxista para aumentar a renda da família. Na entrada do Morro da Mineira, deparou-se com uma intensa troca de tiros. Segundo o jornal que noticiou sua morte: “guerra entre facções rivais”. Baleado, chegou a pedir para não ser morto por que tinha que criar seu filho.

O nome Benjamim significa “filho da felicidade”. E nós, que conhecemos seu pai, sabíamos que ele estava preparando toda a felicidade do mundo para o seu Benjamim.

Os pais de Samuel estão despedaçados, sua esposa de 17 anos tem nos braços mais um bebê sem pai, as crianças para quem dava aula não sabem o que pensar ou sentir, a comunidade chora a perda de um de seus moradores mais amados.

Faltam palavras para definir uma tragédia dessas. A fé, a disposição, a garra, o carisma desse jovem de 25 anos foram ceifados por uma guerra estúpida e sem fim. Que serve apenas para dizimar a juventude pobre e geralmente preta do país. E para alimentar os poderosos que lucram com a falácia e o cinismo de uma guerra já mais do que desmascarada. 

As maiores vítimas dessa violência são pessoas inocentes e trabalhadoras, que representam a imensa maioria dos moradores das favelas do Rio de Janeiro. Enquanto isso, os moradores do asfalto seguem silenciosos, sem empatia com famílias que são destroçadas à bala. 

Benjamim irá conhecer Samuel pelas fotografias e pelas histórias que ouvirá sobre um jovem que foi assassinado justamente quando estava mais feliz, pois tinha realizado o sonho de ser pai. Mais um carioca atingido pelo descaso de uma cidade que enterra diariamente e sem piedade seus filhos pretos e pobres.

Samuel geralmente aparece sorrindo nas fotografias. A não ser nas fotos com seus alunos após o treino, quando fazia cara séria para registrar que mais uma aula tinha sido dada. Ele levava a sério seu trabalho. Amava o que fazia.

E tinha muita fé no futuro...

 Renato Farias

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