Coletivo Indra

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Pensamentos Ancestrais, Diversidade Cultural, A Leitura e Educação na Literatura Indígena na Atualidade

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Os conhecimentos ancestrais são a base de sustentação da identidade indígena de um povo, seja ele qual for.

Numa época colonizadora, onde a colonização portuguesa e espanhola foi determinante na formação do novo contingente na chamada América Latina, falar de identidade indígena é quase que possuir um rico diamante diante das perdas culturais e violências que os povos originários enfrentaram.

No entanto, esse rico diamante está internalizado de tal forma na vida dos povos originários que mesmo com tantos massacres, retrocessos e até genocídios comprovados pela história, esses povos continuam exercendo o seu direito à sua identidade, que é o seu maior patrimônio!

Não que isso tenha sido concedido, mas conquistado com determinação e luta pela sobrevivência física, cultural e espiritual desses povos, mesmo com o processo de miscigenação que ocorreu em tempos e lugares.

Nesse processo de reconstruir-se a cada tempo, a cada época ou a cada século, povos indígenas além de manter sua identidade buscam viver de forma sustentável, porque sua visão de vida e de mundo é uma forma que preserva a terra e seus recursos naturais, sendo uma sociedade com visão democrática produtora e distribuidora, onde o ego não existe e o outro é o seu referencial. Sendo assim, muito líderes indígenas na América Latina evocaram seus cânticos lutando e dando suas próprias vidas pelos seus povos.

Essa forma de pensar sustentável foi observada pelos grandes filósofos, pensadores e educadores, socialistas ao longo dos últimos séculos em nosso continente. Foi graças a alguns deles, em cada país, que algumas leis e constituintes foram determinadas pela preservação da vida originária e contra a violação aos direitos indígenas.

Por exemplo, no Brasil, a Lei das terras instituída em 1850, determinou que territórios indígenas fossem patrimônios da União e não podiam ser privatizados. Nesse sentido, as terras não poderiam estar em mãos empresariais à mercê da vontade colonizadora, política que as levavam a um processo de degradação física e cultural. A partir dessa lei, o ano de 1978 se constituiu num marco político dando início a um processo de lutas reivindicatórias pelos direitos dos povos indígenas no Brasil, onde houve uma grande mobilização da esquerda brasileira composta de sociólogos, antropólogos, escritores, artistas, professores e políticos sensibilizados e essa luta durou até os dias de hoje. Enquanto isso, em outros países ferviam as ditaduras militares e povos indígenas eram massacrados. Outros mecanismos e legislações surgiram com essa pressão na luta pela preservação dos direitos humanos dos povos indígenas.

Foram 20 anos de trabalhos árduos para se chegar à importantíssima Constituição Brasileira que se deu em 1988. O congresso nacional, nessa época, encheu-se de indígenas de todo o território brasileiro. E o item do o código civil foi derrubado que dizia que indígenas são “menores de idade” por incapacidade intelectual.

Enquanto isso, no plano internacional tivemos 30 de anos de árduos trabalhos nas Nações Unidas, no Grupo de Trabalho sobre Povos Indígenas, nas Nações Unidas. Indígenas e cientistas traçavam a Declaração Universal dos Direitos Indígenas, uma conquista mundial dos direitos humanos dos povos originários. Entre umas e outras legislações, convenções e assembleias, foi deliberada a convenção 169 da OIT, que garantia a identidade indígena aos povos indígenas do mundo inteiro.

Segundo o censo de 2010, no Brasil, a população indígena aumentou para um milhão, onde a Amazônia detém 98% dessa população. As pessoas tinham medo ou vergonha de assumirem-se indígenas e as auto declarações até hoje não param de crescer.

Outro grande marco que tivemos no plano internacional para toda a população do planeta foi a Conferência Mundial de Meio Ambiente, em 1992, onde foi redigida a Carta da Terra, com calorosa contribuição dos ambientalista, indígenas, sociedade brasileira através das ONGS e instituições acadêmicas. Nessa época todos os olhos estavam virados para os povos indígenas e suas contribuições sustentáveis. O mundo queria um modo sustentável de viver dada a poluição ao meio ambiente, aos grandes desastres ambientais, a escassez das águas, as mudanças climáticas entre outros temas de importância ambiental.

Em todo esse processo histórico e político, intelectuais indígenas de formação universitária, se organizavam para traçar o pensamento indígena brasileiro através de linhas mestras que remodelassem a educação indígena no Brasil e que eles pudessem através das letras refletir no papel, todas as suas inquietudes.

Foi aí que veio à tona o grande questionamento a cerca da educação indígena, que já vinha sendo questionada por professores sensibilizados. E é nesse bojo que surge a chamada e questionada Literatura Indígena, uma maneira de expressar nossas histórias, lendas, pensamentos e criações artísticas literárias propriamente ditas.

Literatura Indígena, um boto em botão!

A literatura dos excluídos ainda é uma pele de Boto que foi destruída ao longo dos séculos e que está esquecida e abandonada no fundo dos rios a precisar renascer ardentemente com a força da alma da natureza e humana. Mas essa natureza está envolta nas amarras dos séculos de dor, do obscurantismo, dos grandes enigmas e contradições da própria existência, do divino e do amor.

A literatura ainda é um segmento cultural e político que não consegue chegar à totalidade das camadas menos privilegiadas social e economicamente do Brasil e do mundo.

Esse Boto literário em botão, na atualidade, precisa ser salpicado com as lágrimas emocionadas da natureza, muitas desvairadas lágrimas. Aí sim, essas feridas do mundo que as mulheres indígenas as eternizaram com seus beijos de cura, bálsamos históricos, histórias não contadas e adormecidas no fundo do rio ou dos oceanos, essas sim, serão eternamente curadas, assim como o Boto literário.

A natureza clama para ser ouvida, o Boto despelado precisa ser ouvido, o grande estrondo do encontro das águas claras e escuras amazônicas suplica secularmente um minuto de audição. Assim é a mente humana: Um mundo imaginário, místico e mítico deste ser que chamamos escritor, escritora, um ser humano diferenciado cujas emoções transcendem a realidade brutal da vida.

Este ser humano vestido também de Boto traz sua alma dilacerada, repleta de feridas e almeja a compaixão do próximo na reconstrução das identidades em busca do ser digno, onde os direitos humanos sejam todos repletos de festas, pétalas de rosas, aromas mais adocicados pela flor do amor e da Vitória-Régia: A cura! A epiderme precisa ser epiderme e não couraça, casco e carcaça.

A visibilidade da literatura indígena é como a vida de uma mulher que viveu mais de trinta anos de dedicação a seu amado, querendo ardentemente ter um filho e ele, finalmente, foi ter um filho com outra, negando-lhe não só a maternidade como o próprio amor e a companhia. O útero ressecado e a pele depauperada dessa mulher foram depositar-se no fundo dos rios e mares oceânicos e ora pacíficos. Ela precisa recuperar a pele de boto, de foca, de golfinho e respirar o ar da luminescência e caminhar com a mulher guerreira a sua frente, nas terras, nos mares, nos rios e nos lagos e transformar esses séculos perdidos em dias de vitória e luz. De lá de cima, de onde ela estiver ficará provado no seu âmago que ela poderá observar, sorrateiramente, o mundo e rirá das tempestades: Ei-la nos marcos de novos ares!

A literatura que me refiro é assim, vem fazendo a caminhada passo a passo com expressões de artistas do passado e da contemporaneidade cantando e contando a cultura popular.

São os escritores caboclos, indígenas, afrodescendentes, mestiços e todas as expressões que não tiveram voz. E a literatura indígena, que do estágio oral saltita pelas letras escritas na estratégia da vivificação das histórias de vida dos ancestrais, clama por sobrevivência e justiça dos direitos autorais. O reconhecimento dos conhecimentos tradicionais, para que seja perpetuado em saberes antigos de curas indígenas, como um patrimônio histórico e cultural, precisa flamejar pelo território nacional a desembocar nas mentes e corações dos escritores indígenas como as águas do Rio Amazonas, que flui mais belo: um reconhecimento conquistado! Assim será para os próximos tempos. A Mãe dos Deuses na defesa da floresta e do planeta, promovendo conhecimento e estimulando a leitura no Brasil e no mundo.

Os autores e as autoras indígenas, aqueles que andam com o guerreiro e a guerreira à sua frente, acabam de florescer a cura desde a ancestralidade oral sedenta pela escrita e por isso ganha de presente parte dessa cura secular, da almejada, da sedenta visibilidade literária indígena, hoje uma conquista em realidade.

As mulheres guerreiras, as chamadas antigas Amazonas e as contemporâneas guerreiras mulheres de todo Brasil, com seu poder de mulher pela criação, seja qualquer criação, podem presentear a todos os seus homens e amados um MUYRAKITÃ (um sapinho) como amuleto verde de proteção à vida eterna da alma humana, aquela que fez algo pelo bem caminhar da humanidade no ato da criação! Literatura indígena, um testemunho da criação literária nas letras dos escritores e escritoras indígenas.

Eliane Potiguara

Instagram @elianepotiguara

Eliane Potiguara será uma visitante neste espaço de quinta-feira, a convite de Renato Farias com a proposta de ampliar a conversa!

UMA ESCRITORA QUE CORRE O MUNDO

*Eliane Potiguara  recebeu do governo brasileiro o Título de “Cavaleiro da Ordem ao Mérito Cultural em 2014.

Foi indicada em 2005  ao Projeto Internacional "Mil Mulheres ao Prêmio Nobel da Paz",

é escritora, poeta, professora, formada em Letras (Português-Literatura) e Educação, especializada em Educação ambiental pela UFOP.

É da etnia Potiguara, brasileira, fundadora da 1ªorg. de mulheres indígenas GRUMIN / Grupo Mulher-Educação Indígena (1988),

embaixadora da Paz pelo Círculo de Embaixadores da França e Suiça.

Trabalhou pela Declaração Universal dos Direitos Indígenas na ONU em Genebra.

Seu livro carro-chefe é “METADE CARA, METADE MÁSCARA”, pela Global Editora, 2004 e em 2019 pela GRUMIN EDIÇÕES.

Ganhou o Prêmio do PEN CLUB da Inglaterra e do Fundo Livre de Expressão, USA.

Possui vários livros infantis e textos, pensamentos e poesias em antologias nacionais e internacionais.

Para acessar seus livros e histórico de vida, visite o site oficial da escritora:

 Site pessoal: www.elianepotiguara.org.br     Institucional:   www.grumin.org.br E-mail: elianepotiguara@uol.org.br/elianepotiguara@gmail.com