Coletivo Indra

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Planeta Terra e Covid-19

Ailton Krenak tem dito insistentemente que um dos graves problemas do modelo-padrão civilizatório ocidental é produzir pessoas adictas em novidade.

A modernidade consagrou-se como uma fábrica de viciados, o vício é em novidade: celular novo, carro novo, relacionamento novo, não importa o que seja, importa ser novo. Por isso, os projetos de inovação, o empreendedorismo meteórico de inventar produtos para desejos artificiais e novos. Óbvio que esse assunto é coisa antiga, muita gente interessante tem pesquisado o assunto.

A filósofa Lélia González tinha dito com a sua tese da América Ladina, que o Brasil precisa do divã, de muitas sessões de terapia para entender um pouco das suas síndromes, das suas neuroses. O Brasil – uma sociedade que só é o que é – por conta das culturas: negra e dos povos indígenas. Do contrário, o Brasil seria um arremedo de Portugal ou uma imitação da Europa lusitana.

Os modelos civilizatórios africanos, afrodescendentes (como se recriaram fora da África) e dos povos originários que já estavam no continente americano antes das invasões são bastante diversos. Porém, têm coisas em comum; do mesmo modo que os modelos euroasiáticos possuem algo bastante peculiar: o desejo por expansão, uma estrutura  organizada para a guerra e tomada de novos territórios. Os estudos do historiador e antropólogo senegalês Cheikh Anta Diop (1923-1986) e do biogeógrafo Jared Diamond (1937) apontam que os povos da Europa e Ásia operam dentro do padrão conquistar, explorar e dilapidar com frequência muito maior do que africanos e do continente americano. Não estamos a dizer que existem povos malvados e povos bonzinhos. Não se trata de maniqueísmos; mas, pesquisas que apontam padrões de comportamento civilizatório. Os padrões euroasiáticos aumentam as chances de colapso do Planeta.

Mesmo nos contextos culturais europeus e asiáticos, nós encontramos repertórios culturais que dizem coisas bem diversas do que é mais comumente encontrado. Afinal, a hipótese de Gaia, uma conjectura científica de que a Terra é um ser vivo foi assinada por duas pessoas brancas do Norte Global, o químico britânico James Lovelock (1919) e a bióloga estadunidense Lynn Margulis (1938-2011), o escritor britânico William Golding (1911-1993) batizou a hipótese científica de teoria de Gaia, Golding era amigo de Lovelock. Gaia é o nome de uma teoria que equivale à outras, tal como dos povos andinos que estão na Bolívia e Peru principalmente, estamos a falar de Pachamama, Mãe Terra, a divindade já existia na cultura Inca.

Na África, o povo Asanti tem um nome para Mãe Terra: Asae Yaa. Óbvio que inúmeros países asiáticos também possuem repertório cultural que pensa o planeta como um ser vivo e interligado com outros seres, criticando a depredação e a espoliação da natureza. Algumas escolas do pensamento filosófico budista também fazem coro com a ideia de uma grande mãe. Como contraponto, nós temos a cultura neoliberal ocidental que classifica o planeta Terra como um lugar pra viver, passível de explorações e intervenções humanas e sem direitos. 

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O problema é muito antigo. Por razões políticas, o problema da humanidade tem sido dar crédito a ideia de que nossa espécie é especial (feita à imagem e semelhança de Deus) e tem direito de explorar tudo que existe, inclusive outros seres humanos, a depender da disputa. 

O Deus abraâmico – do judaísmo, cristianismo e islamismo - pela sua onipotência, onisciência e onipresença passou a ser um modelo perseguido pelas empresas, Estados, super-heróis e, sobretudo, o Mercado. A lógica de que tudo pode ser vendido e comprado se tornou o deus supremo. Ora, isso à revelia dos sentimentos de Gaia, um super-organismo que quer manter o equilíbrio da vida. Portanto, tudo que vai contra o equilíbrio vital no Planeta se torna uma ameaça grave.

A humanidade, por razões agravadas pelo capitalismo neoliberal predatório, tem dito algo como: “mais importante do que a vida de Gaia, é transformar tudo em mercadoria”. Existem teóricos quilombolas e de povos indígenas do Brasil e toda América Latina que dizem que Corona vírus número 19 (Covid-19) é um contra-ataque do planeta Terra para eliminar uma doença. Sem fazer muito alarde: essa doença é a humanidade – já argumentou o filósofo e xamã Davi Kopenawa no livro Queda do céu. Óbvio que nem todos são diretamente culpados, Kopenawa explicou que os brancos são os grandes responsáveis pela catástrofe; mas, como diz o ditado: “paga o justo pelo pecador”.

Daí, Antônio Bispo dos Santos, Ailton Krenak, Davi Kopenawa (estão entre meus filósofos prediletos) que se a gente (humanidade) não tomar jeito; o Planeta vai seguir a vida sem a gente. É hora de tomarmos tino e tomar juízo. A lição para isso está debaixo do nariz, só não enxerga quem não quer, os territórios quilombolas e as terras indígenas têm um vasto repertório. Tudo começa por mantermos o equilíbrio do Planeta, para de poluir, de desmatar e de modo mais geral de industrializar a vida.

Renato Noguera

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