Coletivo Indra

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Racismo na TV em três atos

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Primeiro ato: no Programa Dança dos Famosos, do dia 06 de Outubro de 2019, o apresentador Fausto Silva fez a seguinte afirmação, “essa raça é sacanagem, na dança, no esporte, e também em outras coisas” - referindo-se à performance da atriz Dandara Mariana.

O apresentador branco fazia menção a um imaginário perigoso, estava implícita a vinculação entre raça negra e performances físicas nas áreas de dança e esportes. Qual o perigo dessa ideia? A racialização zoomórfica presente no discurso. A recíproca seria verdadeira?

Alguém diria, a raça branca é colonizadora e corrupta – os casos da Operação Lava Jato até o ano de 2019 só envolviam homens brancos, algumas mulheres brancas, esposas, irmãs, mães e cunhadas dos principais acusados. Ora, isso nos daria o direito de uma afirmação indutivista, tomando uma situação particular como condição suficiente e necessária para afirmação universal? Ora, que todos os políticos acusados na primeira fase da Operação Lava Jato sejam homens brancos, faz de todos os homens brancos bandidos e corruptos? Por que o bom desempenho de uma mulher negra faz da dança e dos esportes algo da essência de todas as pessoas negras? Racismo.

Porém, Faustão não percebeu o que disse no primeiro momento. A maioria das pessoas não percebe, porque o racismo está naturalizado. Ele é estrutural e estruturante. Em outras palavras, todos os dispositivos da sociedade foram formatados dentro de um molde racista. Antes de qualquer coisa, pessoas negras são pessoas negras. Pessoas indígenas são indígenas, enquanto uma pessoa branca é apenas uma pessoa. A sua condição racial não diz algo a seu respeito. 

Segundo ato: nesse mesmo ano de 2019, a jornalista Maria Julia Coutinho, Maju, começou a apresentar um Programa chamado Jornal Hoje na mesma TV Globo. Pela primeira vez, uma matéria publicou todos os erros da apresentadora na estréia. Um fato inédito. As críticas tinham motivação racial.

Terceiro ato: uma afirmação do jornalista William Waack que circulou em Novembro de 2017 referente a cobertura das eleições presidenciais estadunidenses de 2016. Ele diz algo como, “só podia ser preto”. Pois bem, os três casos podem ser “punidos” de uma maneira diferente. Na ocasião, Faustão não foi demitido, as colegas de trabalho de Maju e William Waack foram. 

Eu entendo que as situações de racismo precisam ser enfrentadas de uma outra maneira, cabem ações pedagógicas e um debate antirracista que situe que toda sociedade brasileira é racista.

O RACISMO NÃO É UM PRODUTO DO “VAREJO”; MAS, DO ‘ATACADO”. 

Não é uma ação interpessoal somente; mas, um conjunto de práticas socialmente estabelecidas. Faustão, Waack e parte da equipe que trabalhava no jornal Hoje reproduzem o imaginário social estabelecido. Não adianta não falarmos sobre o assunto, quando essas situações acontecem temos oportunidade para um bate papo franco que deve ajudar pessoas brancas a compreender como são privilegiadas pelo racismo.

O PRIVILÉGIO BRANCO É UMA COISA QUE PRECISA SER ENCARADA DE FRENTE, SEM MEDO, SEM FRAUDE E SEM FAVOR. O PRIVILÉGIO BRANCO É ALIMENTADO PELO RACISMO, INTEGRA-O COMO SEU EFEITO MAIS PROMISSOR EM FAVOR DAS PESSOAS BRANCAS.

Por isso, esses “deslizes” são muito importantes, não podemos deixá-los passar com silêncio. Nós precisamos nos ocupar deles e fomentar políticas antirracistas. Qualquer esquiva a respeito do assunto é uma oportunidade de manutenção do racismo. Ou seja, nós temos que conversar sobre esses assuntos desconfortáveis e como diz o livro Racismo: uma questão de todos nós  editado e publicado pela Fundação Roberto Marinho em 2018, as pessoas brancas – beneficiadas pelo racismo – precisam entrar na conversa sem ideias ainda mais perigosas como: “racismo reverso”, inclusive assumindo os seus privilégios mais profundos.

É terrível, uma sociedade em que apenas pessoas brancas podem fazer qualquer coisa e serem vistas como indivíduos e não falantes em nome de sua raça. Elas são apenas pessoas. As falas de Faustão e Waack, assim como as críticas duras contra Maju são exemplos disso. O racismo impede que pessoas negras possam ser interpeladas do mesmo modo.

UM DETALHE IMPORTANTE, O RACISMO É UM DOS PRINCIPAIS, QUIÇÁ O MAIS CRUEL, INIMIGO DA DEMOCRACIA. 

Renato Noguera

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