Coletivo Indra

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Silêncio-Anunciação

Adriana Sá

Dia desses fui na rua (amo esse conceito de rua para se referir ao centro da cidade) e voltei pra casa com a cabeça zunindo, com as vozes ecoando lá dentro. Graves, agudos, enunciados projetados a longa distância, caixas de som ritmadas por todos os lados, todas as lojas, todos os gêneros, rua nua.

A atmosfera de fim de ano parece aumentar ainda mais a frequência. O Hohoho e o tudo novo de novo deixa os espaços ainda menores e as pessoas ainda mais frenéticas em cumprir o que no fundo é mais do todo da convenção do que de um eu em pleno ato de auto prazer.

Fato é que, num espaço macro ou interior, perdemos o hábito de ouvir o silêncio. Entramos numa loja e é música tocando, sentamo-nos num bar é som & imagem, pegamos o transporte e todos são obrigados a ouvir todos. Fazemos o possível para não ouvi-lo pelo medo de escutarmos algo mais ensurdecedor. Silenciar é se conectar com um outro lado da vida que nem sempre sopra ao nosso ouvido o que é gostoso - e o que esperamos - ouvir.

Esse ano univitelino de 2020/2021 (parece que foi tudo uma coisa só, o mesmo calendário, o mesmo horóscopo, a mesma lua, a mesma lista) nos obrigou a ouvir o silêncio que tanto evitamos. Uma emudecer que nos constrange, nos desconcerta, nos faz sobrepor sons e soterrar vozes.

O aprendizado, ainda que doloso e compulsório, fez a gente perceber a importância de ouvirmos nosso canto mais profundo. Não pensarei no que fiz, no que deixei de fazer, no que deveria ter feito. Não haverá planos, projeções.

Ainda na dúvida se 2022 será um recomeço ou uma continuação, a única certeza que tenho é de que não haverá lista, rasgarei os comparativos e me escutarei cada vez mais.

 Felipe Ferreira

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