Coletivo Indra

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Sobre VERDADES E FAKES

Netiz

“Ando muito preocupada com a juventude de hoje em dia...”

Essa era uma frase que compunha o texto da personagem Tia Daiá do espetáculo CANDACES A RECONSTRUÇÃO DO FOGO de 2003 da Cia dos Comuns. O texto completo falava da preocupação da personagem com uma perspectiva de futuro de uma juventude que ignorava o passado.

Hoje, quando me coloquei diante da tela em branco para escrever, essa frase me veio à mente por uma preocupação quanto a perspectiva de futuro de uma juventude que, em sua maioria, além de ignorar seu passado menospreza também seu presente.

Com a globalização o mundo se tornou interligado, conectado. Com o advento da internet isso foi potencializado ao extremo. As informações chegam, abalam e transformam tão rápido quanto são esquecidas e/ou substituídas por outras. Podemos saber em tempo real o que está acontecendo em cada canto do mundo. Os realitys potencializam isso quando podemos acompanhar o dia a dia das pessoas a cada segundo de suas intimidades. Tudo em um tempo muito acelerado que torna tudo descartável para abrir espaço para o próximo.

Da mesma forma que temos a possibilidade de fazer com que debates sobre temas relevantes para a sociedade e para o progresso da humanidade, do planeta, cheguem ao maior número possível de pessoas na velocidade da luz, também temos o outro gume da faca que faz com que –talvez por conta da rapidez com que o interesse das pessoas muda acompanhando a velocidade do veículo – os assuntos sejam banalizados e minorados por uma parcela muito grande desses consumidores e produtores de conteúdo.

Temos uma geração inteira forjada por essa realidade virtual. Uma realidade FAKE construída a partir de diversos filtros e efeitos de edição que vendem verdades fabricadas para atender a um interesse imediato que precisa estar constantemente sendo alimentado.

Uma realidade onde a verdade – que já é subjetiva porque depende do ponto de vista de quem vê – ganha ainda mais subjetividade por que passa a ser regida pelo interesse do aumento ou da diminuição de números de seguidores construídos por algoritmos que em si já é algo que fisicamente não existe.

Pode parecer um papo retrógado, de quem resiste a modernidade, mas não é (apesar de eu ter ainda um vídeo cassete e um aparelho de dvd que, pasmem! Funciona e eu uso rrs).

A minha preocupação é que essa figura do “influenciador” é em si uma faca de dois gumes. Você pode influenciar, mexer com o ponto de vista do outro de uma forma superpositiva como também pode fazer de uma maneira absurdamente danosa. Quando utilizada para influenciar as pessoas em um caminho construtivo, instrutivo, reflexivo (o que pode e deve ser feito com todo humor, leveza e agilidade visual e de comunicação que a internet proporciona) é muito bacana e diria necessário porque corresponde e dialoga com o mundo que vivemos: tecnológico, ágil, onde tudo é urgente. Ou seja, aqui se parte do conteúdo que é inserido na forma irônica, debochada, leve e despretensiosa que em grande parte caracteriza esse perfil de comunicação.

Mas o outro gume dessa faca é justamente quando o conteúdo é guiado pelas características desse veículo e não pela sua pertinência. Regido pela necessidade superficial de um padrão estabelecido de beleza e comportamento. Guiada por algoritmos que castram ou impulsionam o número de seguidores. O valor ou a relevância do que se oferece não está no conteúdo em si mas no número de pessoas que o seu carisma (calçado na superficialidade e construído a partir e pela expectativa do outro) pode atrair.

Tudo fica raso e rápido. As coisas vão perdendo o seu valor e importância para uma grande piada ou leveza despretensiosa.

Vemos uma parcela grande da juventude atual, intitulados criadores de conteúdos, alimentados por marcas interessadas no número de seguidores do influenciador, banalizando conceitos que baseiam a nossa formação de indivíduo e sujeitos sociais. Conceitos como honestidade, amizade, verdade ou mentira, ética, são colocados em um patamar de poderem ser pervertidos sem culpa, e se o influenciador for julgado por isso é só dizer:  “Ah é isso, gente! Errei, fazer o quê?” de preferência com uma carinha bem fofa e segue o baile. Até o temido cancelamento ocorre em um momento e basta pedir desculpas e ter uma boa assessoria de marketing e pronto! Voltamos ao baile.

Essa grande parcela de influenciadores atinge em sua grande maioria pessoas muito jovens, ainda em formação, reforçando essa visão superficial sobre nossas ações influenciando negativamente uma geração da qual muitos deles também fazem parte.

Com carinhas fofas, sorrisos clareados e corpos esculturais essas pessoas vão se escondendo atrás dessas faces fakes e mesmo quando confrontadas com seus erros, elas riem, fazem piada, dão uma piscadinha, manda um sorriso e vão em frente.

Mentir não é piada! Falsidade não é fofura! Dissimulação não é estratégia admirável!

Esses são pontos sérios e graves que, se tratados com irrelevância, podem causar danos muito profundos em um contexto macro de sociedade. Vide o que estamos vivendo atualmente em um país governado pela mentalidade da fake News e do deboche sobre questões sérias como as mortes de Covid.

Esses jovens de hoje serão os adultos de amanhã.

Ando muito preocupada como a juventude de hoje em dia...

Tatiana Tibúrcio

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