Condição de Saúde da População Brasileira
Entenda porque os programas sociais são fundamentais
Em colunas anteriores escrevi sobre a desigualdade no nosso país. O Brasil é considerado um país pobre porque 42% da população vive com uma renda familiar de até R$ 2.800,00. Enfatizo que “até” não significa que os 42% estão no mesmo patamar.
Aqui, na verdade, temos um grupo extremamente heterogêneo. Em 2020, 10,4% da população (em torno de 21,9 milhões de pessoas) viviam com até ¼ do salário mínimo per capital mensal (cerca de R$ 261) e 29,1% (61,4 milhões de pessoas) com até meio salário mínimo (cerca de R$ 522). Ressalta-se ainda que na região Nordeste, 46,3% da população vivia com até meio salário mínimo de renda mensal.
Em 2020, segundo o IBGE, o rendimento médio domiciliar per capita, considerando toda a população brasileira, foi de R$ 1.349.
Quando avaliado por região, mostra-se, conforme esperado, heterogêneo, apresentando maiores valores no Sudeste, Sul e Centro Oeste - de R$ 1.623, R$ 1.597 e 1.504 respectivamente; e menores no Norte e Nordeste – de R$ 896 e R$ 891 respectivamente. Se avaliarmos o rendimento domiciliar per capita mediano os valores ainda são menores: R$ 836 para todo o Brasil, sendo R$ 524 para a região Norte e R$ 514 para a região Nordeste, menor do que o salário mínimo nacional. Essa informação demonstra claramente uma diferença na distribuição de dados, que não segue a distribuição normal (caracterizada pela média igual a mediana).
Não precisamos fazer muito esforço, para perceber que esta renda é insuficiente para a garantia de condição básica de vida. Neste sentido, considerando que a condição adequada de vida está diretamente relacionada à saúde e, esta é um direito garantido pela Constituição Federal (1988), o estabelecimento de programas sociais para auxílio econômico imediato da população é fundamental.
Vale ressaltar, todavia, que estes não excluem a necessidade de estabelecimento de políticas públicas à longo prazo, para a garantia do acesso das classes mais vulneráveis à melhores condições de alimentação, moradia e emprego, bem como para a sua formação técnica.
O gráfico abaixo traz dados de distribuição de três grupos de auxílios sociais, a saber:
Bolsa Família, Benefício de Prestação Continuada – BPC e outros programas sociais governamentais em 2019/2020. Observa-se na série histórica uma redução percentual no programa Bolsa Família e um aumento no grupo de “outros”, caracterizado especialmente pelo Auxílio Emergencial, programa pontual em decorrência da pandemia. Vale ressaltar ainda que, considerando as diferenças de renda/vulnerabilidade social entre as regiões brasileiras, o Norte e Nordeste foram aquelas em que os programas emergenciais tiveram maior crescimento nestes anos – 7,5 e 8,4% respectivamente; impactando positivamente na renda domiciliar total nestas regiões.
Gráfico 1. Distribuição percentual dos benefícios de programa sociais governamentais, por respectivas fontes – Brasil – 2012-2020.
Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua 2012-2020. Nota: Dados consolidados de primeiras visitas de 2012 a 2019 e de quintas visitas em 2020.
Quando avaliado o país como um todo, o rendimento domiciliar per capita médio do país diminuiu 4,3% entre 2020 e 2019, porém com diferenças entre os décimos de rendimentos (Gráfico 2). Os décimos representam a estratificação da população de acordo com a renda.
Dessa forma, os primeiros quatro décimos correspondem à população mais pobre. Em 2020, os 10% com os menores rendimentos apresentaram as maiores diferenças na variação de renda, mostrando o impacto mais intenso dos programas emergenciais de transferência de renda sobre a base da distribuição dos rendimentos. Por outro lado, nos 10% com os maiores rendimentos as diferenças foram praticamente inexistentes.
Gráfico 2. Variação anual do rendimento domiciliar per capita, por condição de recebimento de benefícios de programas sociais, segundo as classes de percentual de pessoas em ordem crescente de rendimento domiciliar per capita – Brasil – 2019/2020.
Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua 2019-2020. Nota: Dados consolidados de primeiras visitas em 2019 e de quintas visitas em 2020. (1) Benefícios de programas sociais incluem: Bolsa Família, Benefício de Prestação Continuada - BPC, Auxílio Emergencial e outros programas sociais governamentais. (2) Exercício simulado com rendimento domiciliar per capita sem a presença de benefícios de programas sociais.
Vale ainda ressaltar que, se simulássemos um cenário sem programas sociais de transferência de renda, e comparássemos com o cenário com transferência de renda, teríamos uma diferença negativa de 6%. O rendimento médio domiciliar per capita apresentado aqui de R$ 1.349 reduziria para R$ 1.269.
Então conseguimos ver o impacto positivo dos programas sociais de transferência de renda na melhoria do rendimento domiciliar per capita, que está, como já dito, associado às melhorias na qualidade de vida, incluindo o acesso aos serviços de saúde. Ademais, gostaria de finalizar essa coluna apontando os diversos trabalhos, já descritos neste coletivo, sobre o impacto positivo do Bolsa Família no controle de doenças infecciosas, tais como a hanseníase e a tuberculose.
Estudo apontam que nos locais com maior cobertura do Programa do Bolsa Família e Estratégia de Saúde da Família tinham menores incidências destas doenças, assim como apresentavam mudanças positivas em alguns indicadores sociais, como “% de população pobre” (43,8 para 29,8%), “Índice Gini” (de 0,56 para 0,53), “taxa de desemprego” (de 9 para 6,9%) e “média de residentes por domicílio” (3,9 para 3,5).
Fica claro a relevância dos programas de transferência de renda para o aumento da qualidade de vida da população, sem tocar na questão do aumento no desenvolvimento econômico local – já que incrementa o poder de compra das famílias.
Cabe salientar que o Auxílio Brasil, que veio em substituição ao Bolsa Família, tem data definida para acabar: dezembro de 2022.
É importante nos apropriarmos destes dados, provenientes de instituições consolidadas como o IBGE, para não só entendermos de uma vez por todas o nosso privilégio mediante a massa da nossa população, e para que exerçamos o novo dever de combater as fake news e as falácias que vem sendo proferidas contra estes programas.
Um abraço a todos.
Rafaella Albuquerque
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Referências
IBGE, 2021. Síntese de indicadores sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira : 2021 / IBGE, Coordenação de População e Indicadores Sociais. - Rio de Janeiro : IBGE, 2021. 206 p. : il. - (Estudos e Pesquisas. Informação Demográfica e Socioeconômica, ISSN 1516-3296 ; n. 44).
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