Defenda o Livro! 

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Há algumas semanas a equipe econômica do governo, liderada pelo ministro posto Ipiranga, defendeu a taxação de livros, que passariam a ser tributados com a alíquota de 12% da nova contribuição que se pretende criar e que substitui PIS e Cofins. É preciso lembrar que, atualmente, os livros no Brasil possuem imunidade tributária pelo texto da Constituição Federal. Ao defender a medida, o ministro Paulo Guedes disse que o livro “é um produto de elite” e, portanto, seria legítima a sua taxação, que levará ao encarecimento do preço ao consumidor. A frase, por si só, já diz muito sobre a visão de sociedade que o auxiliar do presidente possui. 

Não é possível falar desse tema, sem lembrar que no Brasil, segundo dados do INAF de 2018, 26% de sua população é qualificada como analfabeta funcional, 34% tendo um alfabetismo elementar, 25% intermediário e apenas 12% com proficiência na leitura. Ou seja, 88% da população possui alguma dificuldade na leitura e apenas 12% tem a capacidade completa de ler, compreender textos e fazer inferências daquilo que lhe é apresentado. Segundo dados do PISA de 2018, somente 0,2% dos alunos do Ensino Médio tem o nível máximo de leitura esperado, enquanto os outros 99,8% revelam algum nível de dificuldade. 

A pandemia do coronavírus tornou esse cenário ainda mais dramático. A necessidade do ensino à distância emerge num contexto onde, segundo dados do Comitê Gestor da Internet no Brasil, 58% dos domicílios não têm acesso a computadores e 33% não dispõem de internet. Ou seja, enquanto existem estudantes com acesso a boa conexão de internet e a possibilidade de acompanhar as aulas a distância, outros milhões ficam a margem desse modelo. Além disso, mesmo que possuam acesso à rede, podem não ter um espaço adequado para o estudo ou, ainda, um computador livre que não precise ser dividido com os responsáveis. 

Taxar livros coloca o Brasil mais uma vez na contramão do mundo e contribui ainda mais para a manutenção dessa desigualdade escabrosa.

Além disso, impede que haja desenvolvimento econômico sustentável e o verdadeiro crescimento do país, para além da mera concentração de renda na mão de poucos, mas aquele que caminhe para a redução da pobreza e maior escolaridade do povo com maior qualidade. 

O desenvolvimento do hábito da leitura é um processo constante, que deve começar bastante cedo, sendo estimulado em casa e na escola, de modo que possa continuar pela vida toda. A “atmosfera literária” é um dos fatores fundamentais para desenvolver o interesse pela leitura. Esta, se faz presente no contato com livros, bem como com outros meios diversificados que estimulem o interesse pelas narrativas e desperte a vontade de ler. Nas crianças a vivência nesse ambiente é fundamental, pois irá impactar no desenvolvimento de seu vocabulário, bem como na formação de um sujeito crítico e criativo, na maneira como compreende e atua em sociedade. Ao encarecer os livros, dificultando o acesso a estes, é certo que o prejuízo aos mais pobres pode se protelar por toda a vida.

É interessante que o ministro justifique a taxação dos livros com o argumento de serem um produto de elite, quando não traz para o debate da taxação das grandes fortunas, ou a cobrança de IPVA de helicópteros, barcos e jatos. Uma coisa é certa: todos estes são produtos de elite. A cobrança de impostos sobre os mais ricos é uma maneira evidente de combater a desigualdade e mais eficiente para financiar os serviços da sociedade. 

Disseminar o hábito da leitura, para além das médias atuais de 2,8 livros lidos por ano por habitante, é fundamental para que possamos vislumbrar um futuro numa sociedade mais rica e plural, com repertório cultural ampliado e que permita ter contato com o que de melhor foi criado pela humanidade, ao melhorar a compreensão de músicas, obras de arte e também da própria condição de sujeito no mundo. Em suma, ler é o que nos permite pensar por nós mesmos, para não sermos meros seres que mugem sem saber o que dizem. 

Arthur Spada

Instagram @arthurspada