Flores, Budas e Despertares
“Então, caíram pétalas de flores e néctar doce do céu e todo o universo tremeu em resposta ao nascimento do Honrado do Mundo!”
Assim dizem os textos sagrados. Filho da Rainha Maya e o Rei Suddhohana, Sidarta Gautama significa “todos os desejos realizados”. O Buda Shakyamuni nasceu no Jardim Lumbini, o norte da Índia em fronteira ao Nepal. Sua mãe faleceu sete dias após o parto, Sidarta foi criado pela tia, Mahaprajapati.
Sábado dia 6 foi celebrado o Hanamatsuri, a Festa das Flores, na praça da Liberdade em São Paulo em virtude do nascimento de Sidarta Gautama, o Buda Shakyamuni, há cerca de 2600 anos. No Japão a data é 8 de abril, no calendário lunar de outras escolas budistas ela varia na lua cheia de maio. Os japoneses foram mais práticos, estipularam uma data fixa até por razão do evento mais importante e de magnifica beleza em seu país: a florada das cerejeiras, as sakura. Na cerimônia de Hanamatsuri, nós banhamos a estátua do Buda Criança com chá adocicado três vezes em um belo andor de flores representando o jardim Lumbini.
As cerejeiras florescem por pouco mais de duas semanas, as mais comuns possuem cinco pétalas, apesar das mais de cem variedades com até 10 ou 20 pétalas, suas cores vão do rosa intenso até branco. O país inteiro se mobiliza para este evento, nos parques e praças são colocadas lonas de cor azul debaixo de um pé para os piqueniques do Hanami, ato de contemplar as cerejeiras, comer, beber e conversar por horas junto às pessoas queridas. As empresas mandam seus aprendizes e estagiários ficarem alguns dias tomando conta do local para seus chefes!
A CONTEMPLAÇÃO DA CEREJEIRA TEM UM SIGNIFICADO PROFUNDO: A TRANSITORIEDADE.
Mesmo sabendo desta efemeridade, todos vão vivenciar o momento presente de rara beleza. Sim, as magnificas e belas cerejeiras vão fenecer, e ao invés de nos lamentarmos a esta ideia, que tal nos alegrarmos e contemplar ao máximo suas delicadas tonalidades e formas, a sua vida em si no aqui e agora. E quando se forem, fiquemos tranquilos e gratos por tê-las contempladas. E que nos intrigados em quantas causas e quantas condições precisaram para florescerem? A mim, que nada fiz, sou presenteado com sua breve graciosidade. A sakura não se preocupa em ser bela, ela apenas é, nem sabe que é bela, não possui vaidade, nem pede nada para que eu a admire. E se eu não estiver lá, continuará a ser bela sem se chatear por estar só. O universo todo se mobilizou para este momento.
Que bom podermos admirar as sakuras! No ano que vem elas irão florescer novamente, entretanto eu posso não mais estar aqui, então que bom tê-la contemplado hoje nesta florada única. Nenhum momento se repete na vida, mesmo sendo parecido, cada encontro é uma oportunidade ímpar, ichigô, ichiê, outro preceito importante. E entendermos conscientemente a real forma da vida: bela, mas implacavelmente efêmera, vivaz, porém frágil. E não se desesperar por seu fim, tudo está bem.
Flores nos ensinam que cada uma tem sua semente, sua origem, seu tempo, sua cor. O que elas nos trazem nesse momento? Assim como elas, somos nós em seus tempos, formas, gostos, percepções, pensamentos. E tudo está bem assim. Sem conflito, sem culpa, sem competição. Nos templos não oferecemos flores ao Buda, é Ele quem nos mostra quem somos por meio delas.
A flor símbolo do budismo é o lótus, muito comum em toda Ásia. Majestoso, floresce acima da água, vista aparentemente por nós humanos como lamacenta, mas é rica em nutrientes. Suas pétalas brancas ou rosas não se maculam, o botão sobe à superfície e abre fora do lodo. Sejamos como o lótus, saindo o mundo lamacento da delusão, da ignorância, das ganâncias, da ira, da avidez, do desejo desenfreado e atentemos à nossa natureza lótus. Não é para florir dentro do lodo, mas fora dele. Sejamos como as sakuras, belas, sublimes e despretensiosas, explodindo em vida florindo os campos, mas tendo consciência da nossa transitoriedade.
O NASCIMENTO DO BUDA NÃO É APENAS DE SIDARTA, É O NASCIMENTO DE CADA UM DE NÓS. DESPERTE.
A pobre cerejeira ignora a chegada da tempestade pela madrugada.
Frase célebre do Mestre Shinran ao expressar o desejo de ser ordenado monge aos seus nove anos, ao replicar o pedido do abade para esperar o dia seguinte.
Gassho
Rev. Jean Tetsuji釋哲慈
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