O Direito de Brincar na Infância

C. Portinari

C. Portinari

As pessoas de minha idade tiveram infância, soltaram pipa, desceram morro de rolimã, caíram das bicicletas, andaram em cima de muro, escalaram árvores. E isso era diário, depois da escola e das tarefas. Até eu fazer 9 anos ainda não tinha TV em casa. Mãe dizia que quando chegasse em casa 17 hs , queria todo mundo de banho tomado. Minha mãe trabalhava 8 hs por dia e nos criamos felizes sem traumas.

Hoje as crianças vão para escola cedo, mas tem o prazer de brincar, muitas vezes num espaço maior do que seus apartamentos. Em cidades pequenas as famílias moram ainda em casa e muitas vezes as crianças não brincam na rua pois ficam na TV e nos ipads.

Brincar vai além da recreação, é uma dinâmica na qual a criança comunica-se consigo mesma e com o mundo ao seu redor. Vejo as crianças  no consultório interagindo com os brinquedos, conversando. Nesta conversa observamos muitas vezes a repetição de condutas da mãe ou dos cuidadores: “Agora todo mundo vai ficar de boquinha fechada”, “Aqui quem manda sou eu e você tem que me obedecer”.  Assim, o desenvolvimento ocorre com as trocas recíprocas. Além de brincar e se divertir, a criança desenvolve a memória, a atenção, a imitação e a imaginação, bem como a sua personalidade, inteligência e afetividade.

Ás vezes, os pais não tem conhecimento do valor da brincadeira para o seu filho. A ideia muitas vezes divulgada, é a de que o brincar seja somente um entretenimento, como se não tivesse outras utilidades mais importantes. O jogo é uma forma da criança se expressar, onde pode  manifestar seus sentimentos e desprazeres. Assim, o brinquedo passa a ser a linguagem da criança. O brincar desenvolve também a aprendizagem da linguagem e a habilidade motora, ao ensinar a criança a correr, escalar o escorregador pelo lado contrário, pula na cama e no sofá.  Brincando ela aprende a interação; a concentração; trabalha as frustrações, quando o encaixe do brinquedo não dá certo, quando a roda do carro não anda. Aprende a perder e lutar para conseguir trabalhar suas habilidades e destreza.

Vygotsky, um dos maiores representantes da psicologia histórico-cultural, afirmava “que o sujeito se constitui ao se relacionar com os outros em atividades caracteristicamente humanas. A brincadeira infantil, nesse sentido, é uma maneira de a criança se expressar e formar sentidos sobre o mundo. Por meio da brincadeira e de atividades lúdicas a criança atua simbolicamente nas diferentes situações vividas por ela, elaborando conhecimentos, significados e sentimentos.” 

Quando os filhos brincam em casa fazem aquela bagunça e temos que deixar um canto para eles. Depois com o tempo os ensinamos a cooperar com a arrumação dos brinquedos. Muitas vezes os pais não permitem que o filho passe por todas as etapas do seu desenvolvimento, e eles fazem isso quando tolhem as brincadeiras, exigem organização, por acharem que estão contribuindo para a maturidade da criança, quanto à aquisição de alguns comportamentos, como por exemplo, o de limpeza. É importante que a família disponibilize  flexibilidade para as brincadeiras das crianças. A imposição de tarefas exaustivas, as incompatibilidades de horários da família são outros fatores que podem impedir as brincadeiras livres.

 Cabe aos pais estimularem a imaginação dos pequeninos, por isso, procure instigar seu filho a trilhar seu próprio caminho e se envolver nas brincadeiras.  Brincar com alguém reforça laços afetivos e quando um adulto se dispõe a brincar com as crianças, ele demonstra afeto e eleva o nível de interesse dos pequenos. 

O mundo moderno nos reserva pouco tempo, e o celular está muito tempo na mão dos pais. Quando chegar em casa, primeiro dê atenção ao seu filho, brinque com ele, para depois se dedicar às suas tarefas domésticas. A qualidade de atenção é muito importante. Muitas vezes a criança começa  a fazer “coisas erradas” só para chamar a sua atenção atenção. É como dizer: “OI!!!!!!, estou aqui”. Você passou o dia todo longe de mim e agora vai ver TV, arrumar a casa, ler as mensagens das amigas. Agora sou eu que preciso da sua atenção e do seu carinho. A imposição de tarefas exaustivas, as incompatibilidades de horários da família são outros fatores que podem impedir as brincadeiras livres.

 Quando as crianças brincam, assumem diferentes papéis. Assim, elas criam mecanismos para agir diante da realidade, substituindo ações cotidianas pelas ações cumpridas pelo papel assumido. É por meio das brincadeiras que a criança estabelece contato com o mundo físico e social.  

A brincadeira em grupo favorece princípios como cooperação, liderança e competição, estimula a autonomia de ação e organiza emoções, estreita os laços de amizade e compartilhamento, estimula a obediência à regras. E os brinquedos e brincadeiras são diferentes para cada idade.

No início até 2 anos, a criança ainda está desenvolvendo habilidades motoras e precisa ser deixada livre no chão para explorar o ambiente. Sempre ter cuidados com tomadas, objetos pequenos e vidros que estejam ao alcance das crianças. Elas não entendem o que é perigo e não obedecem ordens ainda.

Entre os 2 e os 7 anos de idade, a criança entra na fase da  simbologia onde já há preferência por fantoches, desenhos, histórias. Já existe a fala e a criança já é capaz de produzir imagens mentais substituir objetos por símbolos. Através desta simbologia, a criança compreende os papéis sociais que integram sua cultura, como o do pai, da mãe, professores, irmãos, entre outros. 

Depois dos 7 anos de idade, a criança entra na fase racional e  passa a ter um entendimento melhor sobre seguir regras. Daí a importância de brincadeiras e jogos nos quais a criança desenvolva estratégias para tomar decisões. Desse modo, as crianças interagem socialmente, descobrindo que não são os únicos sujeitos envolvidos nas ações, desenvolvendo a empatia e a capacidade de entender os objetivos de outras pessoas.  

Gostaria de acrescentar a este texto com poemas sobre BRINCAR.

  

O Direito das Crianças – Ruth Rocha

Toda criança no mundo
Deve ser bem protegida
Contra os rigores do tempo
Contra os rigores da vida.

Criança tem que ter nome
Criança tem que ter lar
Ter saúde e não ter fome
Ter segurança e estudar.

Não é questão de querer
Nem questão de concordar
Os diretos das crianças
Todos têm de respeitar.

Tem direito à atenção
Direito de não ter medos
Direito a livros e a pão
Direito de ter brinquedos.

Mas criança também tem
O direito de sorrir.
Correr na beira do mar,
Ter lápis de colorir…

Ver uma estrela cadente,
Filme que tenha robô,
Ganhar um lindo presente,
Ouvir histórias do avô.

Descer do escorregador,
Fazer bolha de sabão,
Sorvete, se faz calor,
Brincar de adivinhação.

Morango com chantilly,
Ver mágico de cartola,
O canto do bem-te-vi,
Bola, bola,bola, bola!

Lamber fundo da panela
Ser tratada com afeição
Ser alegre e tagarela
Poder também dizer não!

Carrinho, jogos, bonecas,
Montar um jogo de armar,
Amarelinha, petecas,
E uma corda de pular.

 

AVIÃO DE PAPEL - Gusmão Cavalcante

No meu tempo de criança
Muita coisa acontecia:

Brincava de pega-pega
Fazia estripulia
Pipa no céu soltava
Tudo era fantasia

De bola também jogava
Andava de bicicleta
Ciranda de roda cantava
No ar jogava peteca

No meu tempo de criança
Muita coisa acontecia
O tempo que ajudava
Parece que não passava

O dia era mais comprido
Um mês parecia um ano
O ano não acabava
Meu Deus quanta alegria

Hoje abro a janela
Saudoso olho pro céu
De repente sou criança
Vejo avião de papel

Hayde Haviaras

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