Para que serviu a CPI da COVID?

Finalmente chegou ao fim a CPI da Covid no Senado Federal, esta que investigou a atuação do Poder Executivo em face da pandemia. Com um relatório de mais de 1000 páginas, votado e aprovado na última terça-feira, 26 de outubro, no qual são atribuídos o cometimento de 9 crimes ao presidente da república e com pedido de indiciamento de mais 80 pessoas – parlamentares, funcionários públicos e empresários – que teriam sua parcela de culpa na tragédia que o país acompanha e já vitimou mais de 600 mil vidas brasileiras.

Para muitos, a pergunta que fica é se a CPI vai dar resultado. É comum no Brasil a população ter a sensação de que “tudo acaba em pizza” e, desde o início da investigação já haviam aqueles que dizem que “isso não vai dar em nada”.

É verdade, o poder as vezes parece incontornável e, num cenário de desmonte das instituições de participação popular e dos órgãos de controle, fica ainda mais aparente a sensação de que os atuais ocupantes dos altos cargos executivos irão se safar de seus atos criminosos.

A potencial ligação do presidente e sua família com milicianos, aqueles que assassinaram a vereadora Marielle Franco, ainda passa impune e aumenta a sensação no seio de sociedade de que nada vai impedir essa rede criminosa de continuar atuando.

Mas, para além de futuras condenações e prisões, que dependem da atuação dos outros órgãos que detém a titularidade para a propositura de ações penais, ou para realizar as mudanças legislativas que são propostas no relatório, é preciso se atentar ao percurso até aqui e tudo o que essa CPI pode nos ensinar.

Como destacou o presidente da comissão, senador Omar Azis (PSD-AM), os trabalhos desenvolvidos no âmbito da CPI certamente serão objeto de diversas pesquisas acadêmicas que os analisarão por vários aspectos, seja no que diz respeitos aos de ordem jurídica, política ou sociais, a respeito do que essa investigação parlamentar provocou.

Essa talvez tenha sido a CPI cujas sessões foram mais acompanhadas desde a redemocratização, com suas transmissões em tempo real na TV e na internet, mostrando para todos como se é o funcionamento de suas sessões e as disputas inerentes a atuação dos parlamentares, contribuindo positivamente para melhorar a percepção das pessoas acerca do papel desses atores.

Nesse sentido, deve ser dado bastante destaque para a atuação das senadoras mulheres que, além de brigarem pelo espaço na comissão, que inicialmente seria composta apenas por homens, tiveram um protagonismo fundamental para o avanço das investigações e durante as sessões que ouviram depoentes.

A CPI também mostrou a realidade do discurso contra a vacinação do presidente da república.

Este não passava de um mero engodo, já que por trás disso estava a intenção da compra de imunizantes superfaturados, que não se efetivou graças a ação da comissão parlamentar. Além disso, o ritmo da vacinação se intensificou enormemente conforme a CPI avançava e afastou as possibilidades de que um discurso antivax – num país que tem uma forte tradição de vacinar sua população – tivesse mais espaço para se desenvolver.

Também deve ser destacado o esforço feito para combater o negacionismo científico, ao levar pesquisadores sérios e comprometidos para depor, e por outro lado mostrando as fragilidades do discurso daqueles que defendiam o famigerado tratamento precoce e terapias que não possuíam respaldo da comunidade médica internacional.

Graças a CPI, veio à tona o escândalo da Prevent Senior, cuja forma de agir somente pode ser comparada a dos experimentos científicos nazistas. As vítimas dessa corporação tiveram espaço para se manifestar e mostraram o quanto uma corporação que visa o lucro acima de qualquer valor humano é perniciosa para a sociedade.

Assim, mesmo que não rendam outros frutos, a CPI da Covid já representa um importante marco da história política do país e seus frutos benéficos já se mostraram efetivos, principalmente no que tange à influência para a vacinação.

Podemos e devemos esperar ainda mais das autoridades competentes com relação aos indiciamentos e futuras punições, mas certamente não dá para dizer que a CPI não serviu para nada.

Arthur Spada

Instagram @arthurspada

Siga no instagram @coletivo_indra