Qual a importância do mico leão dourado?

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Hoje, dia 30 de setembro de 2020, o Brasil chega aos 4.777.522 casos e 142.921 óbitos por COVID-19.

Chegamos a esta marca em termos de casos e óbitos por diversas razões, que perpassam pelo desconhecimento sobre a doença em si, mas também pela falta de convergência e adoção das medidas de prevenção e controle por parte da população. Não é surpresa que o nosso governante máximo (aquele que não dizemos o nome) é contraditório e estimula animosidade entre os distintos grupos da população. Ao mesmo tempo que relativiza o potencial de disseminação e letalidade da doença, este último principalmente nos grupos de risco, causa uma histeria coletiva quando aborda em sua fala, temas como a economia.

Já tive diversos momentos de discordância com colegas, que insistiam em defender as atitudes do tal presidente, mesmo sabendo que parte da população acredita piamente nas falácias proferidas por este. Foi com base no menosprezo do problema que vivenciamos e no pavor de enfrentar a crise econômica que virá, que o presidente conseguiu, talvez sem muito esforço, desmerecer a atitude de governadores, que instituíram medidas mais rigorosas para o enfrentamento desta pandemia. Conforme descrito pelo colega Artur Spada na sua coluna do dia 25 do corrente mês, não é o primeiro momento na história em que a desconfiança no governo atrelada a falta de entendimento das etapas necessárias para a comprovação científica de novas ferramentas de controle, provocou falhas no enfrentamento de doenças. Quando pensamos na revolta da vacina, ou qualquer outro movimento contrário ao que prega a ciência, claramente consigo perceber a nossa falha, não necessariamente atrelada a saúde, mas sim atrelada a educação. Hoje mesmo conversei sobre isso. 

Como conseguimos ter êxito no repasse de informações para que a população entenda qual a sua participação no contexto de contenção de uma doença em expansão?

O que culminou na revolta da vacina foi exatamente a imposição do uso de uma ferramenta sem explicar a população não somente quais os benefícios da utilização dessa ferramenta, mas também os malefícios da sua não adoção. Talvez isso seja um ponto interessante. Não sei se você, leitor, já parou para pensar nas consequências, não necessariamente para você, da sua escolha em não aderir a uma medida fundamental para o controle de uma doença. Quando existe a recomendação e ainda assim escolhemos não nos vacinar ou não vacinar os nossos, impactamos diretamente no coletivo, pois rompemos a possibilidade de estabelecimento efetivo da imunidade rebanho. Favorecemos o surgimento de bolsões de suscetibilidade, o que culminará inevitavelmente no retorno de algumas doenças imunopreviníveis em processo de eliminação. Mais uma vez este foi um exemplo do colega Arthur, quando discorre sobre os casos de sarampo, que nos fizeram perder o certificado de eliminação da doença no país em 2019.

O exemplo que utilizei para tentar explicar o impacto coletivo de uma decisão individual pode ficar até mais claro. Certa vez, em conversa com uma pessoa muito querida, foi-me dito que ao não aderir ao uso do cinto de segurança, você impacta negativamente na saúde de outra pessoa. Fiquei meio sem entender, já que esta para mim era uma escolha individual, mesmo com uma consequência econômica embutida. Entretanto, caso haja um acidente e você precise sofrer a consequência da não utilização do cinto, aquele leito utilizado por você em um hospital de atenção secundária ou terciária, poderia ser utilizado por uma outra pessoa que diferente de você não fez uma má escolha. E quando você utiliza o leito por irresponsabilidade, você poderia estar tirando de uma outra pessoa a possibilidade de utilização deste mesmo leito devido a um infortúnio. 

Conseguem perceber como decisões aparentemente individuais podem ter impactos no coletivo?

Então, imagine o impacto que uma fala “mal-dita”, um conselho ruim, uma mentira proferida, pode acarretar na vida de outra pessoa? Agora eu preciso que vocês imaginem que o portador desta resenha é o presidente. 

Que impacto essa fala pode trazer em termos de Brasil?

Será que ele não deve ser responsabilizado?

Voltando à questão da educação, porque parte da nossa população consegue ter uma visão mais ampliada dos impactos negativos das falas e atitudes do “dirigente” e outras pessoas não? Qual o poder interpretativo temos para analisar o que nos espera no futuro? Por que não temos uma disseminação mais equânime do conhecimento? Como conseguiremos combater as fakenews, uma vez que o algoritmo gerado pela tecnologia não consegue distinguir o que é verdadeiro do que é falso? 

Sei que são muitas perguntas, mas todas elas, de alguma forma, têm a mesma resposta: precisamos capilarizar a educação. 

É preciso ler. 

É preciso discutir. 

É preciso saber qual o nosso papel no contexto geral das doenças. 

É preciso entender que somos agentes da nossa própria saúde. 

É preciso entender que o mico leão dourado não está presente na Amazônia, para não sermos enganados com falsas notícias. E quando eles justificarem, que queriam mostrar a área de interseção entre a Mata Atlântica e Amazônia, é preciso lembrá-los de que você tem conhecimento, e que essa área de interseção não existe.

Abraço,

Rafaella Albuquerque

Instagram @rafaas28