A prisão do deputado e o avanço das milícias bolsonaristas

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A prisão do deputado e o avanço das milícias bolsonaristas

Os últimos dias do noticiário político têm sido movimentados pela prisão em flagrante do Deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), em razão de um vídeo publicado nas redes sociais, no qual fazia acusações e ameaças a ministros do STF, além de ataques à instituição em si e de defesa da ditadura.

A prisão foi determinada pelo Ministro Alexandre de Moraes e referendada pelo plenário do Supremo. Daniel Silveira era um cabo da polícia militar do Rio de Janeiro que possuía uma vasta ficha de indisciplina na corporação. Emergiu para a política na seara do bolsonarismo que tomou conta das eleições de 2018 e foi eleito deputado federal. Nas eleições, ficou famoso por rasgar uma placa em homenagem à vereadora assassinada Marielle Franco, num palanque durante discurso do então candidato ao governo do Rio, Wilson Witzel.

Silveira é um desses personagens da ala mais indisfarçada do que é o bolsonarismo: autoritário e violento, que testa rotineiramente os limites das instituições democráticas, sob a desculpa de uma guerra em busca da moralidade pública, além de defender o regime militar e seus piores atos.

O ataque em vídeo feito por ele, traz a memória as manifestações do grupo “300 do Brasil”, que no ano passado se prostraram com tochas e arremessaram fogos de artifício contra o prédio do STF. O episódio, levou a prisão de líderes do movimento, como a bolsonarista Sara Winter, que possui um discurso idêntico ao de Silveira.

Ainda que os fatos não estejam diretamente relacionados, é notável que este caso ocorra dias após a edição dos quatro decretos do presidente, que facilitam o acesso a armas pela população. Dentre as mudanças apresentadas, é aumentado o limite do número de armas que podem ser adquiridas – cidadãos comuns passam de 04 para 06 – sendo diminuídos os mecanismos de fiscalização e controle. Tais decretos, foram publicados na sexta-feira que antecedeu o carnaval mais triste que o país já teve.

Bolsonaro pretende formar uma milícia política no Brasil para defesa de seu governo, sendo o armamento da população parte desse projeto. Em mais de uma ocasião nos seus dois anos de mandato, o presidente afirmou que o povo deveria ser armado para que tivesse condições de se insurgir contra uma possível ditadura. No contexto da pandemia, o discurso foi reformulado. Agora também, caso a população fosse armada, defendeu que teria condições de resistir contra governadores e prefeitos que restringissem seus direitos e sua liberdade – em alusão crítica às necessárias medidas de isolamento social.

O presidente possui bastante popularidade entre os membros de baixa patente das forças policiais do país, onde suas ideias antidemocráticas encontram aderência.

Como mostra uma pesquisa citada pela Revista Piauí em agosto de 2020, frases de ataque ao congresso e ao STF, como as que levaram à prisão o deputado, são compartilhadas publicamente por ao menos 12% de policiais militares, 7% de policiais civis e 2% de policiais federais, que fizeram parte da amostra da pesquisa. Nesses dados, não foram consideradas postagens privadas, de sorte que o número poderia ser muito maior que o considerado e chegar até a 120.000 policiais.

Aqui também vale lembrar dos projetos de lei orgânica das policiais civil e militar, que o jornal Estado de São Paulo chegou a noticiar, em janeiro, que o Congresso se preparava para colocar em pauta para votação. Nestes, é prevista maior autonomia das corporações frente ao controle que hoje é exercido pelo Poder Executivo dos estados. A escolha dos comandantes das policiais não competiria mais aos governadores, que hoje são os chefes maiores da Polícia Militar e Civil, além de serem impostos critérios mais rigorosos para a troca dos comandos. Também é prevista a patente de general para a Polícia Militar e um Conselho Nacional de Polícia Civil ligado à União.

Essas medidas, poderiam levar a criação de um poder paralelo que colocaria os governadores submetidos ao comando das polícias, além de aumentar a influência da orbita federal sobre essas forças. São projetos ruins para a sociedade, mas que encontram um alinhamento ideológico com o governo federal, que pode se utilizar da defesa deles para agradar a essa base de apoiadores.

Ainda que seja a justificativa dada por quem defende tais medidas, essas mudanças legislativas são incapazes de contribuir para a melhoria da segurança pública do país. Esta, que é uma questão sensível para a sociedade brasileira, e que a esquerda peca por se ausentar substancialmente desse debate, não será resolvida por medidas vulgares, ao contrário, o problema pode se agravar, especialmente porque a lógica bolsonarista de “mais armas, mais segurança” não tem qualquer amparo na realidade. Ocorre justamente o contrário, como mostram pesquisas e defendem especialistas no tema.

Ao fim, o que se verifica é que há uma clara intenção em armar a população com o intuito último de que defendam esse projeto de barbárie e de atraso com a própria vida, eventualmente se impondo contra o resultado das urnas em 2022, caso bolsonaro convoque. É assim que agem regimes autoritários, como Maduro na Venezuela com sua Milícia Nacional Bolivariana, que é o braço armado de sustentação de regime, composto por civis apoiadores do chavismo.  

 Daniel Silveira é um exemplo típico de como pensam e agem os integrantes dessa milícia bolsonarista em gestação – avançada ou não - advinda das forças policiais, que pode ter suas fileiras engrossadas com a população armada adepta desse pensamento. Por ora, Daniel segue preso e pode perder o mandato, caso o conselho de ética da Câmara cumpra seu papel com rigor, dando indicação de que esse comportamento não é tolerável na nossa república. O problema são todos os outros Cabos Silveira que estarão dispostos a entrar nessa disputa nos próximos anos, são só com vídeos nas redes sociais, mas colocando em práticas as ameaças. 

Arthur Spada

Instagram @arthurspadaSiga no Instagram @coletivo_indra

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