Ensinar a ser aceitos, aprender a ser aceitos

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“Eu não vejo as coisas como elas são. Eu vejo as coisas como eu sou.”

Algo me faz corroborar a frase da pensadora francesa Anaïs Nin. Dela deriva muito da atitude humana condicionada por diversos elementos externos como ensinou o Honrado do Mundo, o Buda Shakyamuni. Somos interdependentes e interconectados. Por seus ensinamentos, o homem é um ser condicionado ao longo de sua existência, nenhum fenômeno é espontâneo ou de sua total propriedade. Imaginemos uma colcha de retalhos milimétricos a que damos o nome de eu.

O que me torna ser o que sou? Provocação I.

Um aspecto do humano é o DESPERTAR, o ELUCIDAR, o ILUMINAR. O acender da luz do sombrio quarto da ignorância e observar com clareza, o abrir da janela da mente e permitir adentrar luz. Despertar significa perceber em profundidade a real forma de si e das coisas, sem o verniz das ilusões, tomar consciência neste desafiante exercício introspectivo, aparentemente enfraquecendo mais e mais.

E o que isto tem a ver com a criminalização da homofobia?

Bom, esta semana voltou a tramitar, para a inquietude dos parlamentares, o indigesto assunto de legalizar a homofobia como crime pelo STF. Deixo as análises técnicas de direito aos especialistas, quem sabe para o meu colega de blog Arthur Spada, pois não tenho espaço de fala neste sentido.

Mas a provocação II é: a punição muda o comportamento?

De um algum jeito, aprendemos com nossos erros, afinal quando enfiei um arame na tomada aos três anos nunca mais repeti a brincadeira. O karma retorna até aprendermos sobre ele. Teoricamente mudamos, perfazendo o aprendizado e amadurecimento como indivíduo. Parece-me que esse mecanismo tão infantil não funciona mais assim para alguns ou muitos. 

A aprovação da Lei Maria da Penha não fez o número de feminicídio diminuir, mas aumentou a quantidade de denúncias, sem intimidar a ação dos meliantes. A sensação de impunidade rumina constantemente pelas mídias a cada triste episódio. Nos casos de intolerância religiosa e racismo são semelhantes. Na homofobia não verei tanta distinção. Paira uma certa paralisia intelectual e comportamental destes assuntos no indivíduo médio. Talvez a história de impunidades e corrupções governamentais reforçaram nossa cultura.

Entretanto, a punição precisa conversar consistentemente com a educação. A educação é a solução, como prevenção de uma sociedade salutar. Sem dúvida, e para isso precisamos iluminar os quartos da ignorância, abrir as janelas da mente dos adultos que hoje decidem a educação dos jovens em uma visão ampla da sociedade que construirão e a constituirão amanhã. Precisamos, aos que estão na vulnerabilidade social, ensinar a ser aceitos e aprender a ser aceitos, sobre uma plataforma de paciência, compaixão, empatia, equanimidade, mas força, persistência, assertividade, coerência, imparcialidade (religiosa) e justiça.

A homofobia é criminalizada em mais de 40 países, até nossos hermanos Uruguai, Chile, Colombia, países europeus, escandinavos e norte americanos. E nós, o que faz essa roda ficar presa nos discursos parlamentares? A voz tradicionalista tem sua forte retórica detratora chegando a alinhar a população lgbt+ a pedófilos. E tudo isso reverbera na opinião pública como uma colcha de micro retalhos gerando marginalização, preconceito, discriminação.

Urge um real recorte do Estado e da religião na mente de muitos parlamentares. A criminalização promove um escudo de proteção e intimidação, mas principalmente legitima e reconhece o direito social de indivíduos altamente vulneráveis. A homossexualidade ainda é o tendão de Aquiles de uma assimetria social de cunho religioso silencioso.

O GGB, Grupo Gay da Bahia, denunciou o Brasil como o país que mais mata pelo fato do indivíduo por sua orientação sexual. Em 2017, foram 445.387 mortes e 58 suicídios, uma morte a cada 19 horas, segundo o blog da Folha de SP deste 20 de fevereiro. Morte apenas por ser. O cenário precisa mudar, rapidamente, a criminalização contribui de alguma forma para isso. A vida é preciosa. Todas elas.

Os fenômenos mentais tem como precursora a mente, fundam-se na mente, são feitas da mente. 

Se um homem fala ou age com mente pura em consequência felicidade o segue, como a sombra que não vai embora. 

Se um homem fala ou age com a mente corrupta, em consequência o sofrimento o segue como a roda nos passos do boi que puxa a carroça.

Versos Gêmeos, 1 e 2, Dhammapada.

Rev. Jean Tetsuji

釋哲慈

Gassho, Namu Amida Butsu

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