LIMITES: Alguns Modos Para Usar.

No dicionário apresenta-se, entre outras definições, como “a  Linha que, real ou imaginária, delimita e separa um território de outro”. E no sentido figurado, “marca a partir da qual não se pode continuar.” Na wikipedia, além dos conceitos matemáticos, também consta que é, pasmem, “aquilo que brasileiro não tem”. Mas deixando as definições ao lado, pergunto:

Você conversa, comunica, entende e respeita os seus limites? 

Você conversa, ouve, entende e respeita os das outras pessoas?

Desde pequenos recebemos informações muito truncadas a respeito deles. Vide quando mesmo após chorarmos, seguem apertando as nossas bochechas ou nos fazendo cócegas. Ahhhhh, essa tal de cosquinha! Que prato cheio para exemplificar esse texto: É muito comum nossos amados, mesmo diante de pedidos insistentes, não pararem de nos fazer cosquinhas. 

É fato que as crianças riem quando as estão recebendo, até aí ótimo. Atalho para estabelecer conexão através do toque e para ver uma criança rir! Mas não é nada incomum que as risadas sejam entremeadas por altos gritos de PARA! PARA! PARA! Deliberadamente ignorados. Aí está um erro. Comum só parar quando a criança, totalmente desestabilizada, chora, soluça, ou urina nas calças. Mais um trauma pra conta!

Outro exemplo é com a comida. 

Quão normalizado é um bebê ou uma criança manifestarem que não querem comer e ainda assim nossos amorosos cuidadores, imbuídos da melhor intenção, enfiam comida goela a dentro ou colocam carnes escondidas no feijão, mesmo que a criança já tenha dito que não queria comer os “bichinhos”. Os médicos já afirmaram: as crianças em situações corriqueiras não ficarão desnutridas se não comerem aquele prato todo ou atrasarem um pouco uma refeição. Se não tiverem fome naquela hora, não force. Basta não dar guloseimas para compensar depois. Uma hora a criança vai aceitar a comida.

Mas voltando da digressão sobre alimentação infantil, quantas mensagens tortas não recebemos desde o berço, não é?! Afinal, as mesmas pessoas que nos deram a vida ou alimento ou proteção ou presença, ou tudo isso junto e mais, mesmo que com a melhor das intenções, não respeitam as nossas vontades. Os nossos limites. 

E UM PASSO ANTES, NÃO NOS ENSINARAM, TALVEZ POR TAMBÉM NÃO SABEREM, A RECONHECER, A IDENTIFICAR, ONDE ESTÃO OS NOSSOS LIMITES.

Assim, crescemos percebendo que tudo bem se meus limites não forem respeitados. E por consequência, tudo bem se não respeitarmos os dos outros. Note que nem entraremos aqui no que tange à violência física! Situação medonha, que ronda milhões de lares no país. Uma respiração profunda e um instante de silêncio, em tributo aos que são agredidos, agredidas e agredides  impiedosamente em seus próprios lares.

Mas voltemos…  

Adiante na vida é chegada a hora de iniciar as experiências com o relacionamento afetivo/sexual. No Brasil, é muito comum que essa hora seja apressada por conta dos incentivos dos amigos ou das amigas e novamente passamos por cima de nossos limites para agradar ou pertencer, afinal, está em nosso subconsciente que aqueles que tanto amamos não respeitavam os nossos desde cedo. E nós, por vezes, não aprendemos a comunicá-los

É tão comum os rapazes insistirem por um beijo já negado, ou avançarem com as mãos nada bobas contra as barreiras claramente já ditas.

Tão normal também as garotas, mesmo querendo o beijo ou uns amassos a mais, dizerem não! Afinal, se fizerem tudo o que estão com vontade, ouviram que é bem provável que não serão valorizadas depois, ou terão suas intimidades expostas.

Espero estar defasado em minha informação acerca dessa etapa de iniciação amorosa, mas na minha adolescência vivi isso de perto. Eu mesmo fui ensinado a insistir, insistir, insistir. Entre os casais havia um roteiro quase pré-estabelecido. A menina dizia alguns Nãos, mas continuando ali, minutos depois, já não os dizia mais. 

Mesmo que um Sim! não fosse dito, vencidas pelo cansaço (ou pelo desejo), se permitiam viver a próxima etapa da experiência. Somente um não mais categórico e incisivo era o comando definitivo para parar. 

Quão violento é isso!

Esse roteiro foi desenhado por uma cultura do silenciamento. Uma cultura que tolera o estupro. Uma cultura que não nos ensina o respeito a nós mesmos e muito menos aos outros. Mais uma faceta do Patriarcado, passada de geração em geração.

Não tendo sido estimulados a entender sobre os nossos limites, ao adquirirmos os primeiros feixes de liberdade, abusamos do álcool, da pornografia, da comida, dos vícios, cometendo violências e mais violências contra nós mesmos.

E se nos violentamos, violentaremos aos outros e a natureza que nos rodeia. 

Fica mais um alerta e uma convocação para aprendermos a reconhecer, respeitar e comunicar nossos limites e consequentemente perceber e acatar os limites das demais pessoas. É mais do que hora de romper esse ciclo de dor e abuso.

Não é não! 

Seja ele dito por um bebê, uma jovem, um adulto ou uma anciã.

Ter isso em mente e gravado na alma é mandatório para permitir  os próximos estágios de evolução que nos esperam.

Alê Girão

Instagram @alexgirao