Tempo, lucidez e autocuidado

Arquivo pessoal

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Esse ano já está cancelado, mas estamos conseguindo chegar - às duras penas - até o seu décimo mês.

Perdi tanta gente querida, que não sei quanto tempo vai levar para entender tudo o que está acontecendo. Aprendi no candomblé e nos estudos africanos que a vida é uma continuidade. Tomamos emprestados esse ará (corpo) para que possamos experienciar essa existência, mas findo o tempo, devolvemos à Nanã essa matéria, para que voltemos a fazer parte do húmus da natureza, enquanto nosso espírito se torna ancestral. 

A ansiedade também tem sido uma tônica.

Não tenho um amigo que não esteja sofrendo desse mal contemporâneo. Eu tenho ficado agoniada com o desgoverno e as eleições, com a fome batendo à porta da população (afro)brasileira (são mais de 10 milhões de pessoas com insegurança alimentar grave, segundo dados de IBGE/2020!) e com a falta de perspectiva de futuro para os mais novos dentro dessa desgraça coletiva.

Sou uma pessoa que exercita a lucidez diária.

Isso me faz menos vulnerável às futilidades e às histerias deste mundo hiperconectado entre si e pouco conectado consigo. A concepção ocidental de Ser e Estar considera a razão como o principal da experiência humana, ignorando as suas limitações neurolinguísticas. Algo que tem me ajudado a passar por este período de forma relativamente bem é justamente o exercício de outras partes do meu ser, que a racionalidade não contempla. Ouvir minhas músicas especiais, aquelas que trazem os cheiros do ontem, o abraço do meu pai, a voz da minha tia são exemplos de exercício.

Tenho dedicado um momento do meu dia para o respirar consciente.

O Ar, nas filosofias keméticas (egípcias), é o elemento da Vida, o que atrela o espírito ao Ser. Substância necessária para existir. Não sobrevivemos se nos falta Ar. Durante essa respiração consciente eu me olho e deixo fluir os sentimentos acumulados no meu dia. Do choro ao riso, tudo flui. Arrependimentos e erros se esvaem com o ar que saem de minhas lindas e grossas narinas.

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Também olho o Tempo.

Esse é o exercício que mais gosto. Me coloco na janela a olhar o céu por uns minutos, deixando ele me dizer quais são as boas novas do amanhã. 

Estar mais em casa tem me feito olhar para meu lar com mais afeto e vira e mexe tô consertando, ajeitando, melhorando algum cantinho.

Priorizei o dia de folga.

Talvez esse tenha sido o maior ato de Amor por mim mesma que fiz este ano. Minha tendência workaholic acrescida ao isolamento fez com que o trabalho, o cuidado materno e o trabalho doméstico se misturassem de uma forma ininterrupta que nunca tinha vivido. E de repente me vi perdendo Força Vital.

Parece filosófico, mas Viver está tão difícil neste 2020 que acho importante dividir com vocês práticas de autocuidado Solar. E quem se sentir à vontade, compartilha comigo o que tem feito para cuidar do Sol da sua humanidade.

E assim, subimos trocando as montanhas de nossas vidas. 

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