Uma lição de filosofia

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No dia 19 de Fevereiro de 2020, uma tese de doutorado foi defendida no Programa de Pós-Graduação em Educação (PROPED) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), o tema foi Olimpíadas de Filosofia no Rio de Janeiro. Lara Sayão Lobato de Andrade Ferraz escreveu mais de 200 páginas sob orientação de Walter Omar Kohan, professor do PROPED.

Uma das lições da tese, dentre outras, está em afirmar que a competição é desnecessária. Com base no pensamento do Maurício Langón, a filósofa Lara Sayão Ferraz defende algo que parece inusitado, uma Olimpíada sem competição. As Olimpíadas de Filosofia no Rio de Janeiro não têm medalhas de ouro, prata e bronze. Não se trata de reproduzir a tese. Mas, de entrarmos numa perspectiva pouco frequentada: a vida não precisa ser competitiva.

EXISTEM TEORIAS CIENTÍFICAS, POLÍTICAS E RELIGIOSAS QUE DEFENDEM, CADA QUAL À SUA MANEIRA E COM SEUS SOTAQUES, QUE VIVER É COMPETIR. SERÁ MESMO?

Uma versão bem popular da teoria da evolução define a seleção natural como um tipo de competição. Algumas religiões entendem que viver é uma batalha espiritual em busca do paraíso, esquivando-se do fogo do inferno – o signo da derrota. A política tem sido uma instância em que a competição é deliberada, correntes opostas se engalfinham e, às vezes, ambas propõe uma salvação suprema de todos os males. Em termos políticos, a vitória numa competição eleitoral dá direito aos grupos vencedores de arquitetar uma sociedade no molde dos seus valores.

A educação no contexto das sociedades contemporâneas tem sido oficialmente vista como uma ferramenta competitiva. Em grande parte das famílias, as gerações adultas se importam com a educação de crianças e jovens, de maneira que investem em escolas, cursos de idiomas e universidades como ativos de sobrevivência das gerações mais jovens. Algumas mães fazem os sacrifícios mais profundos de ter pouco contato com uma filha para que ela possa ter as “oportunidades” que ela não teve, para que essa menina seja alguém na vida no futuro. Para que ela vença. Estudar se transformou num treinamento competitivo. No ano de 2019, um dos cartazes da 7ª Olimpíada de Filosofia do Rio de Janeiro dizia: “a gente estuda para partilhar e não para competir”.

“NÓS PODEMOS VIVER SEM COMPETIR?”.

Esta é uma pergunta que não podemos deixar de lado. Algumas teorias são enfáticas em dizer que não podemos deixar de competir. Algumas leituras psicanalíticas argumentam que desde cedo, pessoas com uma irmã ou um irmão já disputam a atenção da mãe e do pai. Trata-se de algo próprio da natureza humana ou de uma ideologia?

Seja o que for: nós podemos questionar e escolher os caminhos, nós podemos escolher visões de mundo e avaliar os seus impactos. Competir tem impactos bastante conhecidos, tanto negativos quanto positivos. Mas, não competir? Nós sabemos bem o que significa sociedades podemos viver sem competição? Não, não sabemos. Talvez, seja interessante apostarmos em não competir. Alguém pode perguntar: como viver sem competir? Isso já é uma outra história e coloca em xeque a mentalidade do projeto neoliberal.

Renato Noguera

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