sem ROMA, com AMOR.
"Quem não pode suportar a dor da separação não está preparado para o amor. Porque amor é algo que não se possui, jamais. É evento de graça".
É a frase que abre a sessão "Amor" de "Ostra feliz não faz pérola", minha Bíblia humana do mundo escrita pelo mestre Rubem Alves. Ele tem o poder de dissecar as emoções e revelar a crueza cotidiana que, às vezes, deixamos passar invisível.
Ver a grafia da palavra AMOR me leva a enxergar as letras que formam ROMA. Tô numa fase de “anagra-minhas” (quem ler meu novo livro “CALI-CE”, a ser lançado ainda esse ano entenderá). Roma trás na bagagem uma atmosfera de domínio, de posse, uma sensação clausurante e opressora que impérios costumam ter como impressão digital.
O esteio da sua alvenaria dominadora sanguinária. Um território que se determina pertencente a "X" ainda que nele habite outros corpos, outros eus, outras verdades, outras vontades. O avesso do que o amor emana, ou deveria.
Amar não combina com autocracias, lideranças unilaterais e contratos vitalícios. Amar é liberdade. É fazer o outro e se deixar fazer livre também.
Ele tem vida própria, não tem certo, não se curva ao capricho do nosso querer. Ele se apresenta quando quer transmutando dor em alegria, vazio e todo. Mas para saber a liberdade que é derrubar muros, deixar os quadros livres na folha, a água livre no Mar, é preciso passar pela ilusória sensação de ter, de sentir-se dono de algo, pedaço de alguém, de fazer uso contínuo do meu pronome.
Como diz o dito popular: é perdendo que se dá valor. Nesse caso, é perdendo que a gente passa a ter consciência de que não estávamos ganhando nada. É um processo similar a nossa relação com o corpo. Ele é livre por natureza.
Mas só quando nos dispomos a conhecer, a entender e a acolher cada parte que o faz único é que adquirimos a certeza de que ele é nosso e de mais ninguém. Uma vez solto no mundo, ele não volta mais para o cárcere de ninguém.
A gente ama, desama, confunde amor & paixão, esquece de se amar, reaprende a delícia que é o amor próprio, se queima com ardor e sem medo. O cíclico cítrico do amor é assim. Dá gozo e ginge. O tão esperado “Te amo” é uma expressão difícil de ser verbalizada não pela falta de sensibilidade das pessoas, mas pela importância que dizê-la passa a ter quando entendemos o que amar alguém quer dizer, a força do seu significado entranhado em cada fonema, em cada confissão.
Lançá-la ao vento é banalizar um sentimento sagrado, é comercializar a expressão de algo que vai além da simbologia da data, do dia, das convenções capitalistas.
Amor moderno, amor de perdição, amor de carnaval, amor sublime amor, amor pra recordar, amor eterno amor, amor marginal, amor de quenga, amor de mãe, amor de índio, amor imaginário, amor estranho amor, amor à vida, amor nos tempos de cólera, amor além da vida, amor líquido… Em meio a tantas conjecturas, predicados e constatações a combinação que melhor se faz é: amor livre.
Na véspera do Dia dos Namorados escrevi sobre o AMOR pra deixar registrado que o sentimento se expressa das mais diferentes formas, nos mais diferentes encontros, nas mais inimagináveis composições, nos mais improváveis acasos. É um alegretriste impossível de ser fixado em uma única pessoa. Sua soberania é inegociável e livre.
Felipe Ferreira
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